domingo, 15 de agosto de 2010

Volta a Marx


* Jacques Lautman (Professeur émérite des universités; ex-diretor de ciência humanas do CNRS-Paris; ex-director do doutorado em sociologia da Université Aix-Marxeille I)
* Texto escrito para a conferência Diálogos Sociológicos (promovido pelo Departamento de Ciências Sociais da UFS), traduzido por Tâmara de Oliveira e originalmente publicado pela revista do Núcleo de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais da UFS (TOMO, n° 12, Jan./Jun. 2008)



Quando eu era um jovem professor da Universidade de Nanterre, mais ou menos em 1975, a força de Marx no mundo universitário era-me ilustrada por um estudante que me colocava regularmente a mesma questão: “qual a posição de Marx sobre isso?” Mas depois da queda do muro de Berlim, o interesse por Marx quase desapareceu – erroneamente, direi eu. Gostaria de lhes mostrar porque é preciso sempre reler pelo menos o Manifesto do Partido Comunista de 1848 (MARX, 1999), o primeiro livro de O Capital (MARX, 1999), que na verdade são três, e os textos históricos – principalmente o 18 Brumário de Louis Bonaparte (MARX, 2001). Não sou um especialista em estudos marxianos e nunca me interessei muito em saber se os manuscritos de juventude já continham todo o Marx ou se, pelo contrário, eles ainda estavam muito próximos do idealismo hegeliano. Isso quer dizer que eu quase não vou abordar o Marx filósofo do materialismo dialético. Além disso, também não vou instruí-los muito sobre o Marx economista. Com efeito, os próprios economistas de orientação marxista renunciaram há muito à oposição entre uma ciência econômica estritamente marxista e a ciência econômica dominante. A propósito, Joan Robson (1959), inglesa, disse de uma maneira definitiva que a medida do verdadeiro valor do trabalho é uma falsa pista (“red herring”). Vou me concentrar então sobre o Marx historiador-sociólogo e profeta revolucionário.


4 comentários:

Cynthia disse...

Opa, que ótimo! Dado o maior número de posts sobre outros clássicos, estávamos devendo no quesito Marx. Obrigada por compartilhar.

Tâmara disse...

Pois é, Cynthia,
Eu tinha esquecido que tenho acesso ao autor desse texto e que ele poderia ser bem-vindo ao Cazzo. Fui eu que convidei Lautman à UFS, aproveitando que ele estava em férias, conhecendo o Brasil. Fiquei surpresa quando, aceitando, ele disse que gostaria de falar sobre a pertinência de Marx a estudantes da graduação, ja' que, sociologicamente, ele nunca foi marxista. O resultado foi uma conferência que encheu mais do que completamente o maior audito'rio da UFS, com a participação ativa e muito interessada dos estudantes - não apenas dos marxistas. E' sempre bom discutir Marx com distância ideolo'gica, né? Por outro lado, tenho certeza que a motivação espontânea de Lautman para abordar esse cla'ssico não foi meramente acadêmica: ele é eticamente angustiado com a dinâmica contemporânea do capitalismo e com a subestimação das desigualdades e conflitos so'cio-econômicos por parte de muitas das sociologias contemporâneas. Abraço.

Gabriel Brito disse...

Senhor@s,

O texto parece tão "objetivo", isto é, seu recorte é tão "preciso" ao se ater a fatores "econômicos" (taxa de lucro e pauperização do proletariado) que deixa de fora tantas outras questões importantes, que acredito que devería-se ter outras postagens sobre o presente tema. Apenas como "compromisso" de imparcialidade.

De qualquer forma, é uma sujestão.

Sds,

Gabriel.

Tâmara disse...

Gabriel,
Não sou a autora, mas a tradutora e alguém que dialoga muito com o autor desse texto. Por isso, autorizo-me a discordar quando você diz que ele se atém a fatores "econômicos". Uma dimensão importante da análise é a do caráter construtivo do compromisso social que sustentara o Estado do Bem-Estar e quebrou-se com a ascensão ideológica e política do chamado neoliberalismo (para outros, pela reconfiguração do capitalismo sob a hegemonia financeira). Ora, essa dimensão não é abordada como fator "objetivo" ou puramente econômico, mas mediada pela chamada escola francesa da regulação - que integra analiticamente dimensões não objetivas da ordem sócio-econômica. Evidentemente, trata-se de texto fundamentando-se em sociologia econômica, logo, outras postagens inter ou transdiciplinares são sempre pertinentes. Mas não foi falta de imparcialidade o que motivou-nos (ao autor e à tradutora) para propor essa postagem aos editores do Cazzo. Pelo contrário, sua postagem sempre esperou contra-análises. Sendo assim, tomar conhecimento de que ele provocou leitura e questionamento quase dois anos depois de sua publicação, deixa a tradutora satisfeita. Espero que estimule outros a propor textos diferentes sobre a atualidade ou não de Marx. Obrigada pelo comentário.