domingo, 10 de outubro de 2010

Dropes e representação social



Artur Perrusi

Jonatas olhou-me, com um olhar meio doido, e vaticinou:

_Artur, por que você não escreve dropes teóricos para o Cazzo?

Fiquei olhando meio assim clinicamente para Jonatas. Aprendi, com o tempo, que devemos encarar o alienado, manter o olho no olho, do contrário seu olhar nos submerge numa grande confusão. Posso dizer que me perdi, baixei a vista, já que fiquei confuso.

_Dropes?!
_Sim, dropes teóricos.

Por coincidência, tinha algumas balas no bolso. Mostrei-as e perguntei:

_Tipo assim?!
_Não, Artur, essas são jujubas. Mas jujubas teóricas são também interessantes.
_Jujubas ou dropes, afinal de contas?!
_Pode ser qualquer uma das duas, contanto que você volte a escrever no Cazzo, porra!

Notei que Jonatas estava se irritando com meu estado confusional. Contudo, insisti:

_Mas o que é mesmo jujuba teórica?
_Falei de dropes.
_Certo, certo – o que são “dropes teóricos”?
_Textos rápidos, Artur, reflexões pontuais, inquietações e intuições teóricas. Eu só quero que você escreva...
_É Cynthia, né?!
_Que é que tem Cynthia?
_Ela está fazendo pressão.
_Todo mundo quer que você escreva, Artur.
_E Cynthia adora chicletes. Vive com chicletes na boca. Fazer chiclete teórico é muito mais fácil, convenhamos.

Pensei em perguntar sobre chicletes teóricos; se não seriam melhores do que dropes; mas, desisti, diante do olhar enfurecido de meu amigo. Jonatas meneava a cabeça e deu um longo suspiro, embora tenha ficado mais calmo quando prometi que escreveria os “dropes teóricos”.

Contudo e todavia, não farei agora um drops teórico, apesar de todo esse preâmbulo. Cynthia pediu-me um texto sobre representação social. E ordens são ordens!

(aceitar uma ordem implica obediência. Se obedeço de bom grado, provavelmente, estou julgando que a ordem é legítima. No fundo, adapto-me a uma relação de dominação. No tamborete do socioanalista, pergunto um tanto cabisbaixo: a adaptação revela uma adesão à dominação?)

Eu me encho, jogo o tamborete na cabeça do socioanalista e começo a escrever.


26 comentários:

Cynthia disse...

E eu nem sabia que estava com essa bola toda.

Artur disse...

Vc manda!

Bem, fiz o que ordenou, um post sobre representação social, etc e tal. Futuramente, farei tb dropes teóricos ou jujubas, que são mais simpáticas e gostosas, convenhamos.

Le Cazzo disse...

Dr. Simão Bacamarte, quer dizer, General.

Com que então os dropes teóricos são ideia minha... Lembrou-me Ariano, que de vez em quando descobre uma piada que lhe atribuem e que ele não conhecia. Ele diz que adota tantas quantas sejam boas. Do mesmo modo, ganharei fama por sua Fantástica Fábrica de Caramelos. Manda bala. Abraço, Jonatas

Anônimo disse...

Porque não tem uma foto dos donos do blog?

Artur disse...

A Bela e as Feras? Não, não suportaria essa comparação. O meio acadêmico impõe limites.

Cynthia disse...

Car@ Anônim@,

Por puro respeito aos nossos leitores. Somos todos incrivelmente feios. Além disso, achamos que essa coisa de corpo não tem nada a ver e estamos treinando para virar puro espírito. Por enquanto, Artur é quem está mais avançado: algumas vezes ele incorpora um espírito demoníaco chamado Refutador; outras, incorpora o espírito de porco. Mas, no fundo, no fundo, é uma boa alma.

Arture, amore, nem te agradeci pelo post. Valeu mesmo. E aproveitando sua boa vontade: para uma monografia de final de curso sobre representações sociais do aborto, você acha adequado o uso de grupos focais ou seria melhor simplesmente algumas entrevistas em profundidade?

Renan Cabral disse...

O que é isso professora! Com todo respeito, uma foto da senhorita deixaria o "Que Cazzo é esse!" mais bonito. Sem dúvida. Quanto aos rapazes, creio que opiniões femininas seriam mais... apropriadas. Tou brincando. Ao contrário da pessoa que postou a questão, creio que a decisão de colocar - ou não - fotos é bem pessoal e envolve muitas razões a se considerar. Mas, penso que umas caricaturas ficariam engraçadinhas. É pena que eu não desenhe tão bem quanto gostaria.

Cynthia disse...

Caro Renan,

Obrigada pela gentileza, mas, brincadeiras à parte, eu imagino que a pergunta do anônimo tenha mais a ver com a vontade de atribuir um rosto aos nossos escritos.

Nós simplesmente não temos uma foto de nós três, nem nunca pensamos sobre o assunto, nem sei se isso é realmente importante. A ideia da caricatura pode ser divertida, mas, ai... que trabalho! E, eu sei, eu sei, o Cazzo anda meio feioso, mas pelo menos está mais legível. Talvez esteja na hora de profissionalizarmos mais isso aqui e prometo que vamos pensar no assunto.

E agora uma pergunta de interesse sociológico. Fora a preocupação evidente em demonstrar respeito, o que faz você se referir a uma mulher como "senhorita"?

Le Cazzo disse...

Quanto à minha opção de não colocar foto minha no blog é por pura modéstia - diante do claro favoritismo que o Pai Celestial (essa campanha presidencial ainda há de me matar) teve comigo quando me comparo com Artur. Jonatas

Artur disse...

Posso colocar a foto de Brad Pitt? É que somos parecidos -- a altura é a mesma. Inclusive, meu apelido na UFPB é Brad Perrusi ou Artur Pitt, como queiram.

Veronica: es ser o no ser? disse...

Sociologia de comer? idéia magnífica. A Emilía(aquela do Monteiro Lobato) uma vez inventou livros pães . Mas, sem dúvida, drops, balas e jujubas são muuuito mais interessantes...E como diria Guimarães ( o Rosa): Pão ou pães é questão de..." blog de ciências socias.

retribuindo a visita e igualmente satisfeita Jonatas

Le Cazzo disse...

Ficamos felizes também de ver você por aqui, Verônica - eu, Cynthia e Benjamin Button. Ainda mais citando Guimarães Rosa de quem gosto tanto... Abraço, Jonatas

Renan Cabral disse...

Cara Cynthia, entendo 'senhorita' como tratamento respeitoso a mulher solteira.

Cynthia disse...

Caro Renan,

Sem desconsiderar sua abordagem extremamente gentil, me permita convidá-lo a uma reflexão (desculpe, mas é vício de profissão): não lhe parece estranho que o status de uma mulher seja conferido pela relação que ela mantém com um homem, e não pelo fato de ser dona de si? É o que aquela senhora, Simone de Beauvoir, chamava de "o segundo sexo", aquele que é definido a partir de um sexo supostamente neutro e universal e que se manifesta na nossa linguagem cotidiana por um termo que não permite inflexão (senhor).

Ultimamente tem acontecido algo curioso entre meus alunos. Diversas vezes eles têm se referido a mim em sala de aula como "a senhora" e, imediatamente, se corrigem, constrangidos - "opa, desculpe! A senhora, não!". Como sempre aconteceu em situações em que não cabia interromper o pensamento para questionar isso, deixei pra lá.

Mas confesso que tenho ficado com uma pulga atrás da orelha. Acho que, em parte, existe uma certa dúvida em relação ao grau de formalidade apropriado para uma sala de aula, mas, em parte, me parece que a questão é outra: é como se o "senhora" fosse reservado a mulheres "velhas", sendo, portanto, ofensivo. Não é a dúvida, propriamente, que me surpreende - pois imagino que alguns alunos dos meus colegas do sexo masculino devem passar pelas mesmas dúvidas em relação ao tratamento mais ou menos formal - mas o constrangimento que se segue ao uso do "senhora". Parece-me que a velhice, para uma mulher, é algo constrangedor.

Pessoalmente, exceto em relações em que eu ache importante manter uma certa distância profissional (especialmente diante da pouca profissionalização dos nossos serviços), prefiro ser tratada por você. Mas acho curiosa essa resistência ao uso formal do "senhora" pelos significados implícitos que ele carrega.

Talvez por essa razão as pessoas de língua inglesa tenham abolido a distinção entre "Mrs." (para mulheres casadas) e "Miss" (para mulheres solteiras) e adotado o neutro "Ms." - independente de geração. Não lhe parece mais simpático?

Abçs

Renan Cabral disse...

Cara Cynthia,

Pessoalmente também prefiro o 'você'. As pessoas esquecem que esse pronome de tratamento vem de 'vossa mercê', que era utilizado quando a pessoa não tinha lá essa intimidade para tratar o interlocutor como 'tu'. Enfim, só para dizer que o medo de parecer mal educado já foi compensado com o 'avô' de 'você', mais ou menos da mesma forma que usei o 'senhorita' em vez do ‘você’.

Hoje parece que formas como ‘senhor’ e ‘senhorita’ soam velhas. Talvez pelo fato de não sermos formais, e até gosto disto. Por outro lado - e para mostrar que não só lá um sujeito muito seguro quanto a essas questões, em inglês – língua utilizada no teu exemplo - gosto de ouvir ‘Sir’ e ‘Madam’. Soa velho, né? Mas acho bonitinho.rs

Mas, de vez em quando gosto de quando as palavras dizem mais. E então poderia utilizar 'senhor', senhorita', também para marcar o ‘marital status’ das pessoas. Mas penso que isso é mais adequado para se narrar, falar sobre alguém e quando o tal ‘status’ importa para o assunto em questão.

Ah! Um álibi, ainda que frágil. Tratei os professores como 'rapazes', enquanto poderia ter usado 'senhores'. Confesso que pensei ligeiramente sobre isso enquanto escrevia e, ainda que não soubesse da vida deles, imaginei que fossem solteiros. Como mais um dado, registro que também tenho por eles grande respeito. A fragilidade do meu álibi vem do fato de que, após abrir o Houaiss como quem apela para um advogado, li - decepcionado: “Rapaz: Homem adulto, mas ainda jovem". É. O Houaiss parece trazer as diferenças de gênero que você pretende evidenciar. E eu, inocente, imaginando dispensar a todos um tratamento igualitário. Mas, como assim? Na minha cabeça o fiz. O dicionário é que não condiz com meu esquema de pensamento não oficial! Sim, minha consciência não pesará em razão daquele dicionário traidor.

Por fim, informo que costumo resolver tudo isso perguntando como o interlocutor prefere ser chamado. Esta é mesma estratégia adotada para casos em que não se sabe a pronúncia correta do nome do interlocutor, conforme a etiqueta. Logicamente, por conta do tipo de contato poupei vocês da pergunta. E a reposta acabou incluindo esse conjunto de normas, que pelo visto vai render ainda mais análise sociológica.

Um abraço,

Cynthia disse...

"O dicionário é que não condiz com meu esquema de pensamento não oficial! Sim, minha consciência não pesará em razão daquele dicionário traidor."

Haha! Então, tá.

Muito apropriado para um texto sobre representações sociais. Vou lhe poupar do discurso - embora não resista a insistir que a diferença entre o tratamento formal para homens e mulheres é que o masculino é definido por ele mesmo. Não existe "senhorito", existe?

E, Renan, na boa... "senhorita" é o fim da picada! Pior do que isso, só o incrivelmente paternalista e condescendente "minha filha"... Pensando bem, tem pior: "filhinha". Dá vontade de dar um sopapo na fuça do infeliz que me chama assim.

Abçs

Le Cazzo disse...

Que conversa surrealista do cão! Jonatas

Cynthia disse...

Jonatas, meu filho, você está atrapalhando minhas reflexões sociológicas. Olha a censura!

Le Cazzo disse...

Te Deum laudamus: te Dominum confitemur.Te æternum Patrem omnis terra veneratur...

Jonatas

Anônimo disse...

"Tu Patris sempiternus es Filius, Tu, ad liberandum suscepturus hominem, non horruisti Virginis uterum."

izabella medeiros disse...

Artur é casado, eu digo logo...

Cynthia disse...

Bem lembrado, Izabella. Portanto, só quem pode chamar ele por apelidos carinhosos é Enaide e as amigas de muuuuuuuito tempo. Sorry, meninas. Sorry, Izabella.

;)

Artur disse...

Só não podem me chamar de Bubu, pois é um apelido sagrado de mãe...

Cynthia disse...

Valei-me, Santa Jocasta!

izabella medeiros disse...

Cynthia, sorry para Renan que agora terá que mudar o pronome de tratamento que ele usa para Artur :b

Cynthia disse...

Haha! Na mosca, Izabella.