Gostei da provocação. E' verdade que desde sa'bado passo por esse vi'deo e fico me perguntando porque não tenho nada a dizer...O silêncio constrangedor dos entrevistados mostra, talvez, um problema ba'sico dos brasileiros,o da dissociação entre uma naturalização automa'tica da rejeição ao aborto e uma hesitação evidente sobre sua criminalização. Diria que o vi'deo indica que ha' luz no fim do tu'nel: a criminalização do aborto parece uma experiência-problema, pelo menos para os entrevistados da campanha, logo, existe a possibilidade do novo em nossas representações sobre essa questão. Por outro lado, quem defende que o aborto continue sendo crime pode contar com aquela rejeição automa'tica que lembra, pelo menos para mim, o efeito da expressão Ave Maria: imediatamente o "cheia de graça/o Senhor é convosco" desenha-se na cabeça. Espero que quem esta' engajado pela descriminalização do aborto no Brasil consiga desenvolver a possibilidade do novo e desvincular Maria do Senhor.Abraço, Tâmara
Engraçado, hoje alguém me disse que as melhores perguntas são aquelas que deixam o outro sem resposta. Bem, eu acho que depende do contexto e da pergunta, mas, neste caso, eu acho que os caras acertaram na mosca. Sempre me surpreendo com enquetes que perguntam se a pessoa é a favor do aborto. Alguém é? Uma pergunta dessas só serve para reforçar aquilo que você chamou de representações sociais ancoradas.
Ainda assim, Tâmara, duvido que o grosso da população brasileira tenha um mínimo de condições de transformar essas questões em experiências-problema. Não com a influência que a igreja católica tem na política, nem com uma mídia da qualidade da nossa.
Enquanto isso, tome gente a morrer com um procedimento que poderia ser muito seguro e bem mais barato para os cofres públicos do que as complicações que decorrem dos abortos feitos sem condições mínimas de higiene e segurança. Isso é o Brasil.
Eu concordo com você, Cynthia, também acho muito difi'cil que os brasileiros tranformem essas questões em experiência-problema. A igreja cato'lica tem isso como questão de honra no Brasil - e acho que não é so' ela. Mas pouca gente vai deixar de fazer aborto por causa disso.
Por outro lado, como a igreja cato'lica e seu grande intelectual Bento XVI andam com a legitimidade tremendo nas bases, este é talvez um bom momento para bombardear os brasileiros com questões que os deixam sem resposta.
Em tempo: faço aqui minha declaração de voto, pensando na significação poli'tica daquelas francesas que, nos anos 1970, declararam-se todas criminosas por ja' terem feito aborto: eu sou sim, a favor do aborto. Ou seja, não se trata, em meu caso, apenas de apoio à descriminalização, apoio este fundamentado numa reflexão sensata sobre os custos humanos da proibição do aborto no Brasil. Não quero dizer com isso que alguém pode ser contra ou a favor do aborto como se pode ser a favor da seleção de Dunga ou da seleção alemã (começaram foi bem, esses pestes; viu?). Mas quer dizer, por exemplo, que a representação da vida humana não é monopo'lio de nenhuma igreja. Mesmo porque, nunca é demais repetir, a vida das mulheres em situação de desespero fi'sico e mental nunca interessa muito aos padres. Maria parece so' tem sentido enquanto carrega o fruto do Senhor. Enquanto eu, desde criancinha, tenho uma absoluta falta de simpatia pelos senhores - de qualquer gênero. Abraço.
é verdade, a descriminalização, sem uma política de saúde pública que garanta acesso universal às mulheres que queiram se submeter a um aborto, deixa as coisas mais ou menos na mesma. Até porque os médicos (pior, suspeito que, sobretudo, as médicas) no Brasil tendem a ser extremamente conservadores e têm uma formação humanística bastante deficiente. Cada vez mais, a formação é técnica.
Quanto a ser a favor ou contra o aborto, creio que a pergunta esconde tanto quanto revela: acho que ninguém gostaria de ter que passar por isso e, em princípio, este é um procedimento que as pessoas se posicionam de forma contrária. O que não significa dizer que não possam, assim como você e eu, defender o direito de escolha das mulheres, que são as únicas que podem decidir se podem ou querem levar uma gravidez a termo.
Você viu o relatório sobre o Estatuto do Nascituro da deputada Solange Almeida, aprovado recentemente, que dispõe sobre os direitos do nascituro desde a concepção? Embora eu duvide que seja aprovado pelo Congresso (por causa das implicações disso nas pesquisas com células tronco), foi uma tentativa absurda de legitimar o parecer do presidente da Comissão de Constituição de Cidadania, o deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), acerca da suposta inconstitucionalidade do PL que visava suprimir a lei que proíbe o aborto (aqui: http://quecazzo.blogspot.com/search/label/Zizek)
E, a propósito: de acordo com o projeto que é objeto do relatório da ilustre deputada, uma discussão como essa nossa pode nos render de seis meses a um ano de prisão, mais multa. Mas o mais bizarro de todos é o artigo que penaliza com 1 a 6 meses de prisão, mais multa, aquele que "referir-se ao nascituro com palavras ou expressões manifestamente depreciativas". Dá pra acreditar na qualidade dos nossos parlamentares?
Não, Cynthia, não conheço o projeto da nobre parlamentar, mas o quadro que você desenha é de sentar e chorar. E realmente é sempre muito importante lembrar do pessoal médico em geral. Conheço muitas mulheres que sofreram mais ainda com o tratamento recebido por médicos(as) e enfermeiros(as) ao chegarem num hospital, sendo tratadas como criminosas hediondas num momento de enorme fragilidade fi'sica e psi'quica, do que com a dolorosa decisão de fazer um aborto. A igreja cato'lica não conseguiria tanto sozinha.Abraço.
6 comentários:
o silêncio é muito eloquênte!! e aí, ninguém comentará?
ester
Gostei da provocação. E' verdade que desde sa'bado passo por esse vi'deo e fico me perguntando porque não tenho nada a dizer...O silêncio constrangedor dos entrevistados mostra, talvez, um problema ba'sico dos brasileiros,o da dissociação entre uma naturalização automa'tica da rejeição ao aborto e uma hesitação evidente sobre sua criminalização. Diria que o vi'deo indica que ha' luz no fim do tu'nel: a criminalização do aborto parece uma experiência-problema, pelo menos para os entrevistados da campanha, logo, existe a possibilidade do novo em nossas representações sobre essa questão. Por outro lado, quem defende que o aborto continue sendo crime pode contar com aquela rejeição automa'tica que lembra, pelo menos para mim, o efeito da expressão Ave Maria: imediatamente o "cheia de graça/o Senhor é convosco" desenha-se na cabeça. Espero que quem esta' engajado pela descriminalização do aborto no Brasil consiga desenvolver a possibilidade do novo e desvincular Maria do Senhor.Abraço, Tâmara
Engraçado, hoje alguém me disse que as melhores perguntas são aquelas que deixam o outro sem resposta. Bem, eu acho que depende do contexto e da pergunta, mas, neste caso, eu acho que os caras acertaram na mosca. Sempre me surpreendo com enquetes que perguntam se a pessoa é a favor do aborto. Alguém é? Uma pergunta dessas só serve para reforçar aquilo que você chamou de representações sociais ancoradas.
Ainda assim, Tâmara, duvido que o grosso da população brasileira tenha um mínimo de condições de transformar essas questões em experiências-problema. Não com a influência que a igreja católica tem na política, nem com uma mídia da qualidade da nossa.
Enquanto isso, tome gente a morrer com um procedimento que poderia ser muito seguro e bem mais barato para os cofres públicos do que as complicações que decorrem dos abortos feitos sem condições mínimas de higiene e segurança. Isso é o Brasil.
Eu concordo com você, Cynthia, também acho muito difi'cil que os brasileiros tranformem essas questões em experiência-problema. A igreja cato'lica tem isso como questão de honra no Brasil - e acho que não é so' ela. Mas pouca gente vai deixar de fazer aborto por causa disso.
Por outro lado, como a igreja cato'lica e seu grande intelectual Bento XVI andam com a legitimidade tremendo nas bases, este é talvez um bom momento para bombardear os brasileiros com questões que os deixam sem resposta.
Em tempo: faço aqui minha declaração de voto, pensando na significação poli'tica daquelas francesas que, nos anos 1970, declararam-se todas criminosas por ja' terem feito aborto: eu sou sim, a favor do aborto. Ou seja, não se trata, em meu caso, apenas de apoio à descriminalização, apoio este fundamentado numa reflexão sensata sobre os custos humanos da proibição do aborto no Brasil. Não quero dizer com isso que alguém pode ser contra ou a favor do aborto como se pode ser a favor da seleção de Dunga ou da seleção alemã (começaram foi bem, esses pestes; viu?). Mas quer dizer, por exemplo, que a representação da vida humana não é monopo'lio de nenhuma igreja. Mesmo porque, nunca é demais repetir, a vida das mulheres em situação de desespero fi'sico e mental nunca interessa muito aos padres. Maria parece so' tem sentido enquanto carrega o fruto do Senhor. Enquanto eu, desde criancinha, tenho uma absoluta falta de simpatia pelos senhores - de qualquer gênero. Abraço.
Tâmara,
é verdade, a descriminalização, sem uma política de saúde pública que garanta acesso universal às mulheres que queiram se submeter a um aborto, deixa as coisas mais ou menos na mesma. Até porque os médicos (pior, suspeito que, sobretudo, as médicas) no Brasil tendem a ser extremamente conservadores e têm uma formação humanística bastante deficiente. Cada vez mais, a formação é técnica.
Quanto a ser a favor ou contra o aborto, creio que a pergunta esconde tanto quanto revela: acho que ninguém gostaria de ter que passar por isso e, em princípio, este é um procedimento que as pessoas se posicionam de forma contrária. O que não significa dizer que não possam, assim como você e eu, defender o direito de escolha das mulheres, que são as únicas que podem decidir se podem ou querem levar uma gravidez a termo.
Você viu o relatório sobre o Estatuto do Nascituro da deputada Solange Almeida, aprovado recentemente, que dispõe sobre os direitos do nascituro desde a concepção? Embora eu duvide que seja aprovado pelo Congresso (por causa das implicações disso nas pesquisas com células tronco), foi uma tentativa absurda de legitimar o parecer do presidente da Comissão de Constituição de Cidadania, o deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), acerca da suposta inconstitucionalidade do PL que visava suprimir a lei que proíbe o aborto (aqui: http://quecazzo.blogspot.com/search/label/Zizek)
E, a propósito: de acordo com o projeto que é objeto do relatório da ilustre deputada, uma discussão como essa nossa pode nos render de seis meses a um ano de prisão, mais multa. Mas o mais bizarro de todos é o artigo que penaliza com 1 a 6 meses de prisão, mais multa, aquele que "referir-se ao nascituro com palavras ou expressões manifestamente depreciativas". Dá pra acreditar na qualidade dos nossos parlamentares?
Beijo
Não, Cynthia, não conheço o projeto da nobre parlamentar, mas o quadro que você desenha é de sentar e chorar. E realmente é sempre muito importante lembrar do pessoal médico em geral. Conheço muitas mulheres que sofreram mais ainda com o tratamento recebido por médicos(as) e enfermeiros(as) ao chegarem num hospital, sendo tratadas como criminosas hediondas num momento de enorme fragilidade fi'sica e psi'quica, do que com a dolorosa decisão de fazer um aborto. A igreja cato'lica não conseguiria tanto sozinha.Abraço.
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