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quinta-feira, 6 de maio de 2010

Animus meminisse horret: um diálogo com o Refutador, um demônio de asas de pterodáctilo e ossos ocos


Uma das manifestações do Refutador...

Artur Perrusi

Num dia chuvoso, faz muito tempo, entreguei um trabalho de mestrado à prestigiosa professora Silke Weber. Tinha como tema a teoria das representações sociais. Suava frio porque, num gesto demente, arriscara demais na feitura do texto.

Não me lembro mais da avaliação silkeana. Sei que fiquei um tempinho na frente da porta de sua sala e, minutos depois, escutei gargalhadas inenarráveis. Suspirei, respirei fundo e fui recolher meus cacos.

Muito tempo depois, publiquei o troço, já recauchutado, na revista Caos, da graduação de Ciências Sociais, aqui da UFPB.

Reedito, agora, no Que Cazzo. Bora ver o que acontece. Talvez, Cynthia tenha uma síncope ou exploda a hérnia estrangulada de Jonatas. Enfim, não desejo mal a ninguém.

Lá vai:


quinta-feira, 4 de junho de 2009

Psiquiatria, Sujeito e Comunicação


"O que eu sempre precisei, acima de tudo, para a minha própria cura e restabelecimento, foi a convicção de não estar sozinho, de não me ver tão sozinho ― uma suspeita encantadora de algum companheirismo e semelhança de olhar e desejo, um momento de relaxamento na certeza da amizade..." Nietzsche
A liberdade de um sujeito é a sua capacidade de adquirir autonomia na criação e apropriação de objetos socializados (Costa, 1984). A sociabilidade humana é fundamental para pensarmos na existência de sujeitos autônomos e livres. O grau de autonomia, por sua vez, está relacionado à capacidade do sujeito humano de se apropriar das quatros dimensões da realidade: a linguagem, a natureza exterior, a natureza interior e o mundo social (Habermas, 1989).

(ahá, olha aí Habermas! Mesmo assim, minha concepção de sujeito era dada e não resultado de algum processo de subjetivação. Na época, utilizava o aporte habermasiano para criticar três "antipsiquiatras": David Cooper, Laing e Szasz)

A autonomia do sujeito humano, por outro lado, está relacionada com o seu processo de emancipação, e esta, por sua vez, depende do desenvolvimento de sua capacidade de linguagem, de cognição e de interação (Noam Chomsky, 1980). Neste sentido, o desenvolvimento da singularidade individual acontece através da linguagem, que é a mediação universal necessária à cognição e à ação humana, e, em particular, à linguagem comunicativa (Habermas, 1989), voltada ao entendimento. Assim, podemos supor que o desenvolvimento da subjetividade pode ser considerado como imanente à linguagem e à atividade comunicativa.

Portanto, é fácil deduzir que a formação da personalidade do sujeito humano é complexa e, até certo ponto, frágil ― nem sempre coroada de êxito; os fracassos acontecem freqüentemente e, entre várias causas, podemos citar a doença mental. No processo de constituição da personalidade individual é necessária, de um lado, a manutenção de uma identidade do eu singular, de outro, a identidade da intersubjetividade. Desse processo interdependente forma-se o sujeito socializado, com capacidade de aprendizagem e de comunicação. Podemos concluir, então, que as estruturas simbólicas da vida intersubjetiva são reproduzidas pela ação comunicativa (1989) ― forma de interação coordenada pela linguagem.

(estou com fortes dores de cabeça, tentando descobrir o que significa "a identidade da intersubjetividade". Como esse blog é direcionado à graduação, peço aos pequerruchos que utilizem minha confusão mental como uma forma pedagógica de evitar o erro)

A doença mental é um entidade mórbida que interrompe em algum ponto esse processo formador da identidade e da personalidade. Se antes era possível uma comunicação coordenada pela linguagem, voltada para o entendimento, com a doença mental, porém, ocorre uma comunicação distorcida patologicamente. O doente não consegue fazer-se compreender pelo outro; ele se isola e seus laços de sociabilidade são fragmentados, ocorrendo um processo de deterioração na sua identidade, tanto em relação a si mesmo como em relação à sua vida intersubjetiva. As grandes psicoses, desse modo, seriam doenças da comunicação patologicamente afetadas.

(embora interessante, minha concepção de psicose é reducionista, isto é, reduzo tudo à comunicação. De todo modo, um antipsiquiatra perguntaria: a distorção da comunicação é produto de uma patologia ou de um tipo de vida social?)

Acreditamos, assim, que a ação comunicativa é incompatível com o asilo. A forma de organização do asilo seria um sistema anti-comunicativo por excelência. Ao invés de tentar restaurar a competência comunicativa de sujeitos que a perderam, o asilo produz o efeito contrário de diminuir ao máximo a ação comunicativa entre os pacientes. Do ponto de vista político, o asilo nega todos os três direitos fundamentais do internado:

a) o direito à palavra pessoal, em que o internado tem de ser ouvido, porque ele só pode ter condições de sair da internação retomando a sua subjetividade;

b) o direito à diferença, ou seja, o direito de manter dentro da instituição a sua identidade, que lhe é roubada nos mínimos detalhes;

c) o direito à cidadania: o protesto do internado contra a instituição tem que ser escutado.

(em suma, ao contrário da antipsiquiatria, não nego a "doença mental" como tal, mas aceito sua crítica ao asilo. Mas substitui-lo por qual instituição? A resposta está no post seguinte, que é uma crítica à antipsiquiatria -- aliás, nele, faço uma crítica sectária a Foucault)

Referências:

CHOMSKY, Noam -- Reflexões sobre a linguagem -- São Paulo: Cultrix, 1980.
COSTA, Jurandir Freire -- Violência e Psicanálise -- Rio de Janeiro: Graal, 1984
HABERMAS, Jurgen -- Consciência moral e agir comunicativo -- Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1989

Artur Perrusi