"Lasciate ogni speranza, voi ch'entrate": Isso é um blog de teoria e de metodologia das ciências sociais
sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010
Eu Estava Errado!
Por Luciano Oliveira
Professor da UFPE
E-mail: jlgo@hotlink.com.br
Eu estava errado! E estou feliz, euforicamente feliz, por ter estado errado! Estava errado quando aqui nesta mesma coluna, semanas atrás, a propósito dos escândalos de Brasília envolvendo o governador e seus trastes, escrevi que era preciso romper a lengalenga de conclamações por rigorosas punições “porque todos no país, eles em primeiro lugar, sabem que elas não virão.” Pois bem: elas começaram a vir. Escrevendo numa sexta-feira de Carnaval do ano da graça de 2010, regozijo-me com a notícia de que o governador Roberto Arruda, preso ontem, vai pelo menos passar a festa do Rei Momo na cadeia, porque o Supremo Tribunal Federal, através do ministro Marco Aurélio Melo, acaba de negar o pedido de habeas-corpus impetrado em seu favor. Évoé, Baco!, como diria Manuel Bandeira. Eu, de meu lado, direi mais tarde no primeiro bar em que entrar nesses dias de folia: “Garçom!”
Não sei quanto tempo José Roberto Arruda vai ficar preso. Provavelmente não será muito. Detido preventivamente para não atrapalhar o andamento do inquérito (leia-se: subornar testemunhas), será solto assim que sua liberdade já não atravancar o lento e solene andamento da justiça. De resto, é consenso geral hoje em dia que a pena de prisão, salvo em casos de periculosidade do bandido, é um absurdo sem pé nem cabeça. Eis aí uma questão sociologicamente importante nesse tipo de crime, chamado de “colarinho branco”: os criminosos são pessoas de unhas limpas, têm todos os dentes e exalam lavanda. Numa palavra, não são periculosos! Isto é: nós não temos medo deles. Diferentemente de um miserável “cheira-cola” que pode ameaçar com uma faca por causa de um celular de 50 reais, esses sujeitos que desviam milhões não alteram nosso comportamento. Não é por causa deles que eletrificamos a casa ou colocamos filtros escuros no carro. E assim eles não causam aquela indignação capaz de produzir linchamentos.
É injusto? É. Mas, ainda pensando sociologicamente, é assim que as coisas são. Esses políticos corruptos são, virtualmente, assassinos repugnantes, porque o dinheiro público que põem no bolso pode ser exatamente aquele que vai faltar na periferia, lá onde a vacina não chega por falta de recursos no orçamento. Mas isso é uma abstração. Na prática, somos incapazes de saber quem exatamente morreu porque o dinheiro faltou no posto de saúde. Diferentemente disso, somos capazes de sentir ódio quando nossa filha, trêmula e apavorada, nos liga para dizer que acabou de ser assaltada num ponto de ônibus por um pé-de-chinelo... É injusto? É. Mas é humano, demasiadamente humano.
Não ficarei com medo quando José Roberto Arruda for solto, a verdade é essa. Se nada de mais acontecer, se o processo se arrastar por anos a fio sem uma condenação, ficarei apenas desolado. Mas que condenação? Na verdade sempre achei que um caso de corrupção deve ser punido com confisco de bens. Chego até a imaginar, para meu deleite, um Paulo Maluf sendo condenado a viver num exíguo apartamento do Projeto Cingapura de autoria dele mesmo quando era governador de São Paulo: sala, dois quartos, cozinha e banheiro. Só. No caso dele, uma deliciosa pena adicional: telhado de Eucatex!
O tom de brincadeira não deve fazer esquecer que estamos vivendo o que pode ser um momento histórico. Normalmente não sou pomposo, mas não posso evitar o tom. Afinal, pela primeira vez na história brasileira, um governador de estado recebe o famoso “teje preso!” por atividades que num passado não muito distante eram capazes de forjar slogans cínicos do tipo “rouba, mas faz!” Segundo noticia a imprensa, o governador de Brasília está revoltado com a injustiça que se abateu sobre si. Afinal, no país do roubo da coisa pública e da impunidade escancarada, por que tudo isso logo com ele? A resposta é simples: porque há sempre um primeiro a pagar o pato. Em termos históricos, isso se chama ruptura; em termos jurídicos, precedente. É a partir daí que se firma uma jurisprudência, que vai daí em diante influir em outros casos. Oxalá tenhamos chegado a esse patamar! É com essa esperança que mais tarde, talvez no mesmo bar, eu grite: “Garçom, desce outra!”
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3 comentários:
Tome uma por mim, Lulu!
Esse ano saio no bloco da Capes. De novo. Ô mundinho injusto...
Será que dava para sugerir o relatório como pena alternativa para o Arruda?
Beijão,
Cynthia
hein?!
Va' entender!
Tâmara
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