Micheline Batista, Artur Perrusi e Jonatas Ferreira
A Fino Traço, em 2012, preencheu uma lacuna editorial existente nas
ciências sociais no Brasil, ao publicar essa coletânea de ensaios
de Hermínio Martins dedicados à ciência e à tecnologia. Celebrado
entre aqueles que se dedicam à sociologia e filosofia da tecnologia,
Martins, Emeritus Fellow do St. Anthony College e pesquisador
honorário do Instituto de Ciências Sociais (ICS) da Universidade de
Lisboa, tem sua obra voltada à sociologia da técnica finalmente
publicada deste lado do Atlântico. Formado na London School of
Economics (LSE), ele foi professor nas universidades de Leeds, Essex,
Oxford e professor visitante nas universidades de Harvard e
Pensilvânia. Na LSE, foi aluno de Karl Popper e orientando de Ernest
Gellner. O Experimetum Humanum traz ao leitor textos escritos
e publicados em livros e revistas acadêmicas de Portugal e do Brasil
e, em todos eles, a marca da enorme erudição de seu autor, seu
trânsito fácil pela economia, sociologia, filosofia. Neste livro,
Martins produz uma crítica cáustica ao otimismo tecnológico, essa
espécie de reconfiguração da ideologia do progresso,
inscrevendo-se numa tradição crítica na qual figurariam Herbert
Marcuse, Ivan Illich, Jacques Ellul, Hans Jonas, entre outros. Sua
erudição impressiona e amedronta quem pretenda resenhá-lo. Um dos
méritos de sua exposição, todavia, é uma estratégia que, em
muitos sentidos, lembra a modéstia de um pintor impressionista. A
analogia aqui, se ela é pertinente, diz menos sobre a capacidade de
produzir ensaios a partir de pinceladas ligeiras, o desejo de captar
o instante, que de certa resistência em impor ao leitor um argumento
rígido que o prive de suas próprias conclusões. Ao invés disso,
solicita que sigamos sua erudição enciclopédica para, ao fim desse
esforço, perceber a riqueza de conclusões que sugere sua
argumentação. Neste sentido, esta resenha, ao reforçar algumas
poucas linhas gerais de algo muito mais rico, presta desserviço à
riqueza de sugestões às quais o leitor cuidadoso terá acesso.
I
Dividido em três partes, Experimentum Humanum expõe, na
primeira delas (“Pensar a Técnica: Questões Preliminares”), a
ideia de que os artefatos técnicos representam extensões do corpo
humano. Porém, Martins não bate à porta de McLuhan para
desenvolver sua reflexão, e sim à de Ernest Kapp, que, em 1877,
teria sido o primeiro a apresentar essa perspectiva de forma
sistemática, dando origem a uma teoria antropológica da tecnologia,
cujo cerne é a ideia de “projeção orgânica”
(Organprojektion). Para Kapp, as ferramentas primitivas devem
ser vistas como projeções de partes do corpo humano, principalmente
da mão (tigelas, ganchos, martelos), enquanto outras teriam sido
criadas a partir das nossas estruturas internas, como as ferrovias
(aparelho respiratório) e os cabos do telégrafo (sistema nervoso).
Para um hegeliano de esquerda – daí o primeiro capítulo se
intitular “Hegel, Texas: temas de filosofia e sociologia da
técnica” –, refletir sobre esses artefatos constitui um caminho
de autoconhecimento humano. Segundo Kapp, o avanço da tecnologia
elevaria eventualmente o homem pré-tecnológico, radicalmente
desprovido de autoconhecimento e de autoconsciência (homo
absconditus) à condição de homo manifestus (a
tecnologia como força exclusivamente desalienante). O “somatismo
tecnológico” de Kapp, que aliás peca por seu antropocentrismo,
acaba sendo sobrepujado por teorias que enfatizam um “gnosticismo
tecnológico”, praticamente seu oposto, ou seja, por esse desejo
milenar de conhecimento da essência das coisas e, ao mesmo tempo,
por um desprezo do mundo material. O termo, cunhado por Victor
Ferkiss, diz respeito a uma série de projetos tecnológicos que
abrigam a pretensão gnóstica de transcendência da condição
humana (sua finitude, contingência, mortalidade etc.), e não
simplesmente melhorar e habilitar os seres humanos a superarem as
forças naturais hostis – como se poderia depreender das
especulações de Kapp. Aqui, encontraríamos a pretensão de
legitimidade da tecnociência contemporânea. A intervenção direta
em genomas substituiria, por exemplo, a lenta evolução biológica.
No campo da inteligência artificial, considera-se a possibilidade de
substituir, dentro dos próximos 40 anos, o cérebro humano
(flashware) por software, isto é, o cogito por
um computo (p. 19). Mas aqui não se trata meramente de uma
análise do discurso científico, mas também a observação do papel
fundamental que o gnosticismo teria desempenhado para o crescimento
da ciência moderna, através da alquimia, da astrologia ou
astrobiologia, do hermetismo e dos ensinamentos cabalísticos.
Neste contexto cultural amplo, Hermínio Martins atém-se a uma
análise das tecnologias reprodutivas, da biotecnologia e do modelo
computacional da mente, que são algumas das aplicações da
tecnociência no mundo contemporâneo. O desenvolvimento das
tecnologias reprodutivas, tão festejadas por feministas como Donna
Haraway, tem suscitado uma “perplexidade moral” e originado
“respostas políticas hesitantes” no Ocidente. O crescimento de
um organismo num ambiente artificial externo ao corpo aponta para a
possibilidade de criar réplicas do ser humano – cópias até
melhores do que o original, ou mesmo cópias sem original, de
que fala Baudrillard. O avanço das tecnologias reprodutivas, em
especial a clonagem, desperta o temor do surgimento de um mercado
para compra e venda de partes do corpo humano para transplantes. Com
isso, suscita questões éticas, morais e mesmo legais, dentro de um
contexto contemporâneo de privatização, atribuição de direitos
de propriedade e apologia ao consumo. No caso das mães hospedeiras,
que cedem seus úteros no formato “barriga de aluguel”, há uma
situação de incerteza moral. Quem é a mãe da criança – quem
encomendou, quem cedeu o óvulo ou quem gerou? Mas é no contexto de
uma discussão sobre o estatuto da condição humana que essas
questões devem ser colocadas – e o ponto de partida de Martins não
nos deixa dúvida a esse respeito. A genética molecular, por
exemplo, avançou nas últimas décadas associada à teoria da
informação, à cibernética e à microeletrônica, levantando
questões que demandam reflexão e, possivelmente, num futuro
próximo, legislação. Os seres híbridos, como os ciborgues dos
filmes de ficção científica, põem em evidência o que Martins
chama de “projeto fáustico”, em que o ser humano brinca de deus.
Se o corpo humano está obsoleto, essa obsolescência justificaria a
hibridização do natural e do artificial, do humano e do não-humano.
No segundo capítulo, desta primeira parte, “Tecnologia,
modernidade e política”, o autor debruça-se sobre duas das
tradições sociológicas que se referem ao “domínio da natureza”
pelo ser humano: a prometeica, acentuada após a Revolução
Francesa, e a fáustica, influenciada pela Escola de Frankfurt e mais
fortemente pela obra de Heidegger. Martins resume a tradição
prometeica como aquela que une o domínio da natureza à emancipação
do ser humano. Já a tradição fáustica pretenderia “desmascarar”
os argumentos prometeicos, não enxergando objetivo na técnica além
de sua própria expressão. Percebamos, nos dois casos, entretanto,
que nos encontramos também no terreno de uma discussão sobre os
mitos que organizam o pensamento moderno.
Forjada na primeira metade do século XIX, a visão prometeica, como
esclarece Martins, nem sempre esteve comprometida com a ideia de um
progresso material ilimitado. Evidentemente, a “infinitização”
do prometeísmo é o que mais nos chama a atenção, seja no marxismo
russo, com sua apoteose a um progresso técnico inevitável, seja em
doutrinas como a da Tarefa Comum, de Fedorov, onde a ciência e a
tecnologia significam a salvação da espécie e mesmo a ressurreição
dos mortos. Uma inspiração para Mary Shelley e seu Frankenstein.
Por outro lado, não foram poucas as versões “finitas” do
projeto prometeico, como, por exemplo, em Comte, autor da fórmula
“saber para prever, prever para poder”. Comte não acreditava em
revoluções técnicas contínuas e enxergava um mundo pós-industrial
“positivo”. O mais importante numa sociedade deste tipo seria o
amor altruísta – por isso, argumenta Martins, Comte pode ser visto
como o fundador do Positivismo anti-tecnocrático, por mais
paradoxal isso possa parecer (p. 48). Outros pensadores prometeicos
enalteciam valores semelhantes, como a justiça e a liberdade.
Movendo-se da tradição prometeica à fáustica, Martins aponta
Spengler com sendo aquele que forneceu a primeira formulação geral
de uma visão fáustica. Em A decadência do Ocidente o autor
oferece um diagnóstico como um prognóstico para o mundo em crise
(p. 49). O primeiro volume, de 1918, coincide com o colapso militar e
industrial da Alemanha, de modo que a formulação de Spengler
acabaria se tornando hegemônica nos tempos da República de Weimar e
do Terceiro Reich. Assim como também foi significativa a
receptividade a outros visionários, como Ernst Jünger, que
postulava a guerra enquanto cumprimento da vocação técnica. Tanto
Spengler quanto Jünger influenciam o pensamento de Heidegger, a quem
se atribui uma imagem fáustica mais filosoficamente sofisticada da
técnica. Heidegger concorda com Spengler na ideia de técnica como
destino, ecos que podem ser encontrados também em Arendt, que advoga
o papel decisivo da tecnologia nos conflitos armados do século XX.
Martins inicia o terceiro capítulo do livro, “O deus dos
artefatos: o princípio de Vico e as tecnologias”, afirmando que a
nossa fé na tecnologia moderna foi inspirada em promessas tal
como preconizadas por Bacon e Descartes, muito mais do que pela
observação de fatos empíricos. Mesmo o conceito de “sociedade
científico-industrial”, enunciado em 1820 por Comte, era muito
mais uma antecipação do que um retrato da época. E, assim,
já nas primeiras décadas do século XIX falava-se na “conquista
do espaço” e no “domínio (ou multiplicação) do tempo”. As
máquinas a vapor, as ferrovias, o telégrafo elétrico, por exemplo,
teriam viabilizado a conquista do espaço e do tempo, trazendo já
para o fim do século XIX o sentido de simultaneidade global que a
internet e a comunicação mediada por computador reiterariam e
aprofundariam muitas décadas depois. Ao longo de todo esse tempo,
não faltaram analogias entre as redes de comunicação e um
“cérebro-mundo” (H. G. Wells), aproximando-se atualmente de um
sensorium mundi cada vez mais conectado através de sensores
eletrônicos ou microchips.
Martins crê na existência de algo de real e eficaz nessas utopias,
seja no caso dos engenheiros saint-simonianos do século XIX, seja no
partilhamento dos ideais do “Novo Comunalismo” californiano dos
anos 1970, com seu repúdio às hierarquias e burocracias, exaltando
o local e a criatividade individual. Esse movimento teria imprimido
um sentido forte ao “pessoal” na expressão Personal Computer,
não apenas por ser um artefato pequeno, de uso individual, mas
principalmente por se configurar um instrumento para o empoderamento
das pessoas. Reflexos neste sentido podemos observar ainda hoje no
movimento pelo software livre ou através de redes como a
Anonymous, de onde saiu o fundador do WikiLeaks, Julian
Assange. O que essas utopias ajudam a criar é uma experiência de um
sentimento de “sublime tecnológico”, misto de admiração e de
temor diante da escala e potenciais destrutivos das grandes
realizações técnicas. Em todo caso, parece que estamos
inexoravelmente condenados ao progresso técnico – e a seus riscos
e incertezas.
Um dos princípios filosóficos que têm legitimado ou mesmo definido
a aventura tecnológica nos tempos modernos é o princípio ou axioma
de Vico, autor de Scienza Nuova (1725): verum ipsum factum,
verum factum convertuntur. Só podemos compreender aquilo que
fazemos ou realizamos. Dito de outra forma, não podemos compreender
as coisas naturais – e, mais profundamente, é preciso produzir a
natureza para compreendê-la. No entendimento de Vico, Deus, criador
de todas as coisas, é o único ser capaz de conhecer a “totalidade
infinita do mundo” – um ataque direto ao cartesianismo e sua
pretensão de ser o único método válido de conhecimento,
desprezando, por exemplo, a história e a filologia. Como uma espécie
de “segundo deus”, o ser humano seria então, para Vico, o “Deus
dos artefatos”, imagem que foi reforçada no Renascimento – Deus
como “criador de criadores”, que eram os artesãos, artistas e
engenheiros, capazes de criar com base em materiais já existentes.
Martins vai buscar em Marx, herdeiro do idealismo alemão, uma
aplicação do enunciado de Vico (p. 88). Marx acreditava na “gestão
racional da sociedade tecnológica” e via a tecnologia humana como
algo transparente e domesticável. No futuro, isto é, no comunismo
pleno, pós-histórico, se consideramos as forças produtivas (melhor
dizendo, o progresso tecnológico) como o motor da história, todo o
pensamento seria de essência técnica.
Para Sorel, o conhecimento científico avança com a intervenção,
manipulação e fabricação das coisas e, de certo modo, provém da
natureza. Na mesma linha, Bachelard defendia que é a “natureza
artificial”, criada em laboratório, que explica, enriquece e
transforma a “natureza natural” imperfeita, incompleta e
estagnada. Natureza artificial que acaba afetando a natureza natural
planetária, como é o caso dos CFCs (clorofluorcarbonos), presentes
em aerossóis, geladeiras e aparelhos de ar condicionado. Para Dewey,
“a ciência e a indústria são duas faces da mesma moeda”. Entre
o método da ciência e o método tecnológico não existiria,
portanto, uma diferença de princípio lógico, mas tão somente
diferenças práticas. Para este autor, os valores cognitivos são
essencialmente manipuláveis e controláveis, ao contrário dos
valores contemplativos, orientados pela atitude estética. Seja em
Vico, Marx, Dewey ou Bachelard, o que se afirma é o valor epistêmico
do conhecimento daquele que faz o artefato, indicando que o obreiro
possui e domina a obra porque é o seu autor.
No entanto, os objetos técnicos muitas vezes apresentam
funcionalidades e finalidades inesperadas. A “lei de mudança de
uso”, formulada em 1880 por E. von Harting e discutida por Richard
von Mises, explicava que instrumentos mecânicos são aplicados para
fins não antecipados, levando à criação de novos tipos de
instrumentos. Na perspectiva tecnocêntrica, admite-se a
possibilidade de criarmos máquinas capazes de se equiparar ou mesmo
superar a inteligência humana. O homo sapientissimun e os
pós-humanos continuariam o projeto do homo sapiens de
“compreender e dominar o universo”, como proposto por Irving John
Good. Porém, se tal máquina for mesmo capaz de conduzir a evolução
do conhecimento e do poder tecnológico sem o ser humano, cairá por
terra o princípio de Vico. A obra não só compreenderia como
ultrapassaria o autor.
O quarto capítulo, “Tecnociência e arte”, parte da expressão e
do conceito “sociedade científico-industrial”, formulados na
França entre 1815 e 1820. O autor explica que esses construtos-tipo
se referiam a traços societais que iriam surgir muito mais tarde,
relacionados ao estágio final do desenvolvimento das sociedades
humanas. De acordo com o “princípio de plenitude tecnológica”,
tudo o que puder ser feito será feito, mais cedo ou mais tarde. A
biotecnologia genética, por exemplo, mostra que é possível mudar e
reconfigurar a vida natural. Se “a era digital não pode ser negada
ou detida”, como prega Nicholas Negroponte, resta-nos descobrir se
essa inevitabilidade é um aviso, uma ameaça, súplica ou promessa,
ou ainda uma mistura de todas essas coisas. Mais uma vez, a
identificação dos elementos religiosos contidos no discurso
tecnológico é uma parte importante na argumentação do
Experimentum Humanum. Assim, por exemplo, o mundo da
tecnociência aparece como destino inevitável. Neste ponto, Martins
retorna a aspectos já abordados em capítulos anteriores, como o
saint-simonismo e a crença na inovação técnica como motor do
crescimento econômico por excelência. Os saint-simonianos, além de
entender a ciência como um “modo de cognição”, argumentavam
que os cientistas deveriam exercer o poder espiritual na civilização
contemporânea. Era o progresso científico-tecnológico servindo a
fins emancipatórios – a poesia das fábricas industriais, a
exaltação da eletrificação rural etc., relegando a pretensão
espiritual do saint-simonismo a segundo plano. Antes da Primeira
Grande Guerra, os futuristas já celebravam o ruído
urbano-industrial, a velocidade dos carros de corrida e dos aviões –
“o sublime tecnológico”, misto de admiração e espanto. O
principal valor estético não estava na natureza, nem na obra de
arte, mas no futuro em si. Um futuro dominado pela “estética das
máquinas”, isto é, pela “mecanização da existência”.
Sirenes no lugar de sinos de igreja, brocas em vez de pianos,
metralhadoras ao invés de violinos. A exaltação ao bélico, aliás,
era uma constante entre os futuristas italianos.
O filósofo da tecnologia Serge Moscovici foi quem cunhou, na década
de 1960, a expressão “estado cibernético da natureza”, sucessor
do industrialismo clássico. Na época, Moscovici não fazia ideia da
dimensão dos processos informacional, digital e computacional que
hoje controlam todos os aparelhos técnicos, da micro à grande
escala, fazendo da cibernética uma espécie de metatecnologia. Tudo
vira informação, inclusive a natureza e a cultura –
evidentemente, não sem a ajuda da ciência militar, seja na
construção da bomba de hidrogênio, seja na criação da Internet
(p. 144-145). A primeira tendência da ciber-arte seria, portanto,
explorar as possibilidades estéticas dos computadores e de suas
ligações com outras tecnologias de imagem e reprodução de imagem.
A segunda tendência seria ir além do exploratório, concebendo a
ciber-arte como uma nova forma de criar o mundo, em conjunto com as
artes pré-cibernéticas ou mesmo superando-as. Esta nova estética
maquínica seria capaz de mudar a vida humana e de nos conduzir para
além dela, marcando nossa morte ontológica, talvez até física.
Neste processo de “desencarnação” é que ocorreria a conversão
do flashware em software de modo único e irreversível.
As provocações da chamada arte pós-humana são inquietantes. Ao
invés da redenção, a superação, o que nos leva de volta a
Ferkiss. Diante de um cenário tão apocalíptico, perguntamos: qual
será o lugar do ser humano quando tiver criado seres superiores, as
“ciberinteligências”? Seremos uma espécie supérflua? Seremos
exterminados pelas nossas criaturas?
II
A
parte II do Experimentum Humanum proporciona uma discussão
“Do trágico tecnológico”. Martins tem uma visão trágica da
tecnologia? A resposta mais imediata seria positiva, afinal, o autor
admite que o “trágico tecnológico” seja inescapável (p. 198).
Mas essa resposta deve ser nuançada, a começar que uma visão
trágica não significa uma posição tecnofóbica. O autor não
defende, por exemplo, um “futuro primitivo”, longe disso. Não
propõe uma distopia, muito pelo contrário. Para utilizar as noções
do autor, Martins possui uma simpatia pela visão prometeica da
tecnociência – uma concepção que recrie criticamente os vínculos
entre a ciência e a tecnologia com a emancipação humana e o bem
comum – embora sem ingenuidade. Talvez, Martins professe algo
parecido a um realismo tecnológico com face humana, nutrido do
princípio de prevenção.
O
primeiro aporte ao “trágico tecnológico” é a discussão sobre
o risco, tal como esta figura no capítulo V, “Risco, incerteza e
escatologia”. Para Martins, o desenvolvimento tecnológico tem uma
característica paradoxal: aumentar os perigos, mesmo as tecnologias
pacíficas. Com essa inferência, ele desmonta as ilusões sobre a
possibilidade de um mundo harmonizado por uma tecnologia desprovida
de riscos. Existiria uma lógica imanente à tecnologia que a levaria
à ampliação do risco, uma espécie de astúcia (demoníaca) da
razão tecnológica? Ou tudo é uma questão de modelos tecnológicos
tornados hegemônicos e que excluíram modelos alternativos? Ou a
razão técnica precisa, necessariamente, de um regulador
deontológico exterior ao mundo tecnológico?
De todo modo, os alertas em relação aos riscos tecnológicos são
mitigados por vários autores, segundo Martins, principalmente os
“tecnofílicos”. Usando a tecnofobia como álibi, tais autores
lastimam a baixíssima compreensão sobre as pequenas probabilidades
do risco. Desinformados, os defensores dessas visões exagerariam a
avaliação do risco – gerando um novo tipo de falsa consciência
que tornaria o risco uma hipérbole. Haveria, assim, uma contradição
entre as avaliações condescendentes dos analistas do risco e as
visões pessimistas das populações ocidentais. A ciência seria
tecnófila e o senso comum, tecnofóbico. As massas deveriam
acreditar, como muitos cientistas creem, no Teorema (ou Axioma) de
Existência Panglossiano (TEP): "há sempre soluções
tecnológicas dos problemas engendrados pelas tecnologias” (p.
161). Uma crença de que as soluções tecnológicas para
problemas tecnológicos apareceriam sempre a tempo corresponderia
à visão da maioria dos cientistas? Como corroboração a essa
hipótese, Martins cita os cientistas nucleares que acreditam
piamente na possibilidade de centrais nucleares ultrasseguras, até
mesmo de forma absoluta. Embora a tecnofobia tenha algum conteúdo
irracional, boa parte do medo repousa em efeitos reais: os efeitos
mutagênicos, teratogênicos, patogênicos, carcinogênicos e tóxicos
ou, ainda, os impactos humanos, somáticos ou genéticos, bióticos,
biosféricos, atmosféricos, climáticos da tecnologia em geral.
Igualmente, a tecnofobia seria função da “vastíssima
proliferação e difusão do modo tecnológico de viver” (p. 160),
atuando como uma espécie de colonização sistêmica e criando uma
“monocultura tecnológica” ou, o que dá no mesmo, um “politeísmo
das tecnologias”.
A tecnofilia e o TEP retroalimentam-se e se nutrem da crença na
“circularidade do risco na tecnologia” (p. 162): os ricos
causados pela tecnologia serão resolvidos pela tecnologia. É uma
crença poderosa, fincada no imaginário ocidental. Seria uma crença
mobilizadora que neutraliza, inclusive, a crítica aos impactos
tecnológicos. Haveria uma racionalidade objetiva neste campo: a
mesma lógica, perfazendo um círculo, criaria o problema e a
solução. Assim, a solução tecnológica do problema tecnológico
gera novos problemas tecnológicos, ad nauseam. Como não
ficar preso nessa lógica e não pender para a tecnofilia? Pode-se
até pensar numa tecnofilia fraca: não haveria solução tecnológica
definitiva, mas sempre provisória – ad eternum.
Mas é possível aprender com os fracassos (p. 189). Ora, eles
“ensinam”, por exemplo, as engenharias. Haveria, com tal
aprendizado, a produção de inovações tecnológicas para,
justamente, evitar fracassos. Novamente, estamos diante do TEP.
Porém, como não se sabe o ponto no qual determinada tecnologia está
perto do caos ou do fracasso, o conhecimento seria “posfactual” –
aprender com catástrofe apenas ameniza o problema, pois não garante
que aconteçam outros fracassos. Afora que o fracasso, muitas
vezes, não é muito bem compreendido. A ciência do fracasso,
afinal, não é exata, e sim permeada de incertezas. Enfim, estamos
diante do velho tema do domínio absoluto da razão instrumental.
Aproveitando
a discussão sobre a noção de risco, Martins faz uma crítica forte
ao construtivismo, principalmente o mais radical – um tipo de
sociologismo que defende a construção social da realidade e não a
construção da realidade social. A vítima é a antropóloga Mary
Douglas que, segundo o autor, torna o risco uma construção social
total. Existiram apenas “culturas do risco”, nas quais o risco
seria imanente à cultura em questão, inexistindo correspondência
fática com o real. Martins nega uma superdeterminação social de
todo tipo de conhecimento – leigo, científico e tecnológico. Para
Douglas, segundo Martins, as avaliações de risco têm uma
sobredeterminação cultural, a ponto de o risco, por ser uma
construção social, não ter relação alguma com qualquer referente
da realidade. Seria assim autorreferente. É o “relativismo do
risco”.
Depois do dito acima, a Análise do Risco Tecnológico (ART) e a
Análise Probabilística do Risco (APR) seriam ilusões cultuadas
pelos especialistas e gestores do risco? A resposta é negativa, pois
Martins recusa simetrizar o conhecimento dos peritos ao do senso
comum, bem como colocar de forma a priori a superioridade da
expertise em relação a todas as outras formas de percepção do
risco (p. 165). De todo modo, relata que não há consenso entre os
peritos, nem na metodologia, nem na interpretação dos resultados
concretos – o que aumenta a insegurança e diminui a capacidade de
previsão, fundamental na gestão dos riscos. Não se pode
superestimar a capacidade de antecipação e de prevenção do
conhecimento científico.
Na verdade, Martins critica a aplicabilidade da definição canônica
de risco (p. 166) – a análise bayesiana não dá conta de
situações hipercomplexas do risco tecnológico. Seria possível
mensurar toda situação de risco? Caso não seja, como prevê-lo? O
que está em jogo, aqui, é a crença na matematização total do
risco. A gestão do risco revelaria um limite à mensuração do
mundo. A situação de incerteza, essa impossibilidade de calcular
todos os riscos, seria chamada por Martins de “problemas mais ou
menos restritos ou irrestritos dos riscos tecnológicos” (p. 169) –
nesse sentido, muitos dos riscos graves seriam irrestritos. Além do
mais, com a velocidade gigantesca das inovações tecnológicas, como
acompanhar e, principalmente, calcular e gerir seus possíveis
riscos?
Diante
das debilidades em calcular e gerir o risco, Martins prefere o
conceito de incerteza. Ora, o risco, por ser uma probabilidade, já
implica a incerteza – ou ainda: o acaso faz parte da necessidade,
logo, é impossível o controle absoluto do real. A incerteza seria
ontológica e não epistêmica. O desejo de controlar o risco é a
vontade de eliminar a incerteza. Mas, como parece impossível evitar
as consequências negativas da tecnologia, o risco transforma-se
novamente em incerteza. Por tudo isso, não causa surpresa que
Martins tenha simpatia pela tese da “incompreensibilidade radical
dos sistemas tecnológicos” – diz que “é, pelo menos,
plausível” (p. 191). Martins, nesse ponto, assinala que a
tecnologia trouxe poder, mas que os efeitos antropogênicos no
planeta ocasionaram uma perda geral de controle. Quanto mais poder
antropogênico, menos controle.
Numa
parte importante da discussão sobre o risco, Martins analisa outro
Teorema (ou Axioma) de Existência Panglossiano, só que dessa vez
relacionado ao mercado e comum a determinados economistas: os
problemas gerados pelo mercado só serão resolvidos pelo... mercado.
Outro princípio semelhante ao TEP seria o Princípio de
Substitutabilidade Infinita (PSI): tudo pode ser substituído,
principalmente os recursos naturais. A economia capitalista poderia,
assim, tornar-se absolutamente artificial. Nesse momento, Martins
empreende uma discussão importante, ao ressaltar a articulação
umbilical entre a tecnologia, a ciência e o mercado ou, resumindo
mais, a tecnociência e o mercado ou, ainda condensando tudo, o
sistema tecno-científico-mercadológico.
A
fusão com a tecnologia e, depois, com o mercado recolocou a
discussão sobre os valores da ciência. A velha autonomia da
ciência, tão reivindicada pelos cientistas, parece esmorecer,
atualmente. O antigo CUDOS (valores do cientista e da ciência,
segundo Merton: comunismo – partilha dos resultados –;
universalismo; desinteresse; originalidade – contribuição a novos
conhecimentos –; e ceticismo) vai se transmutando em PLACE
(propriedade; localismo; interesse; compromissos; e expertise). É
uma mudança deontológica e vocacional. O cientista torna-se um
empreendedor e a ciência, uma engenharia.
Se a passagem do CUDOS ao PLACE, como sentido vocacional da
tecnociência, não obstaculiza a produção científica, até mesmo
a desenvolve, tal fato significaria que a ciência prescindiria, nas
condições da investigação científica e da inovação
tecnológica, de valores de base altruísta e vinculados ao bem
comum. Caso essa hipótese esteja correta, podemos ir além e nos
perguntar: a prática científica tem uma relação necessária com
valores e práticas democráticas? Ou pode conviver com ambientes
totalitários, principalmente as ciências duras, sem que sua
produção e criatividade sejam afetadas de maneira significativa? A
comprovação de tais inferências recolocaria, como absolutamente
prioritárias, as discussões éticas no seio mesmo do habitus
científico. Até então, a ciência prescindiu de discussões
axiológicas, porque existe a crença de que há uma relação
necessária entre a produção científica e a democracia. Porém, a
liberdade do cientista corresponde à liberdade civil?
Depois
de toda essa análise crítica, cabe a pergunta: como evitar as
catástrofes? A resposta não é conclusiva. Além do mais, os
estudos de custos e benefícios desconsideram, geralmente, as
calamidades ou catástrofes que têm um risco baixo. Martins fala de
“razoabilidade” (p. 186). Prega uma mudança política, cujo
objetivo fosse uma relação mais estreita entre tecnociência e
democracia – uma relação mais transparente, talvez colocando, de
vez, a tecnociência no espaço público democrático. Martins abre
outro caminho ao defender a utilização de critérios popperianos de
falseabilidade para avaliação de tecnologias (p. 198). Seria um
critério cognitivo e ético. Há uma defesa do falibilismo
popperiano como uma ética para a tecnologia (p. 200). Seria apenas
uma indicação? Na verdade, Martins considera absolutamente
necessário o surgimento de uma ética, cuja função seria balizar o
uso da tecnologia e direcionar as inovações tecnológicas. Como uma
espécie de deontologia da tecnologia, Martins defende o Princípio
Precaucionário de Precaução (PP), uma regulação normativa
construída fora do espaço tecnocientífico, mas que pode regulá-lo
por dentro. Com a normatização do PP no Estado de Direito, o ônus
da prova fica com os produtores de tecnologia. Apesar disso, o PP não
prescreve a sustentabilidade forte, e sim a fraca: “o capital
natural pode ser destruído desde que sua perda possa ser compensada
pelo aumento de capital artificial” (p. 202).
Aproveitando o ensejo ético (p. 206), Martins denuncia a acrasia
(fraqueza da vontade). Seria um termo para entender uma situação
bem típica: produzir uma ação, fazer uma coisa ou tomar uma
decisão, mesmo sabendo que podem ser nocivas para nós todos. Com a
acrasia, há uma dificuldade imensa em mobilizar práticas e
argumentos contra determinadas ações que nos trarão prejuízos.
Aos poucos, a fraqueza da vontade pode se transformar em falta de
vontade, trazendo como consequência la belle indifférrence
diante do mundo e suas tragédias.
Não
causa surpresa que Martins termine a análise sobre o risco
discutindo ética, pois o capítulo VI, trata justamente de um
problema “demoníaco”: “Experimentos com humanos, guerra
biológica e biomedicina”. É sobre o Mal, portanto, de que se
trata – o Mal Tecnológico? E o começo do Mal é eugênico –
justamente a eugenia negativa, quando se torna consenso a prevenção
do desvio social, incluindo os psiquiátricos. É um mundo onde a
biologia e a medicina começam a colonizar o campo axiológico e, aos
poucos, as classificações sociais passam as ser norteadas pela
trindade normal-anormal-patológico. Bem pior: é um mundo onde a
biologia torna-se um dispositivo de guerra. Nesse capítulo, tomamos
conhecimento da Guerra Biológica (GB) implantada e travada pelo
Japão, antes e durante a Segunda Guerra. Os fatos são
impressionantes e comparáveis aos feitos dos nazistas. Foram 13 anos
de intensa GB. Segundo Martins, o Japão foi o primeiro país a levar
a cabo uma biomedicina tanatocrática industrializada (p. 216). Todo
o aparato biomédico japonês estava envolvido na GB. Houve um
“utilitarismo” científico que facilitou ou teve uma afinidade
eletiva com a experimentação humana. A guerra torna tal
utilitarismo uma ideologia quase irresistível, que continua com
alguma eficácia, mesmo em tempo de paz.
Deveriam os cientistas, por motivos éticos, descartar descobertas
científicas que foram realizadas em condições abjetas, envolvendo
seres humanos? Se, à primeira vista, a pergunta nos encaminha
rapidamente a um retundo sim, as respostas dos cientistas tornam a
discussão mais nuançada. Por exemplo, o bioeticista Arhtur Caplan
tem a seguinte opinião sobre a experiência em que foi inoculada
sífilis em prisioneiros negros, uma experimentação com seres
humanos que durou quarenta anos e só acabou em 1972: “o que
sabemos hoje dos efeitos devastadores da sífilis sobre o coração,
o cérebro e as articulações é, em parte, baseado nesse estudo”
(p. 221). Utilizar os resultados da pesquisa faz-nos cúmplices das
experiências ou, ainda, aumentando o peso da pergunta, utilizar os
resultados das experiências nazistas em humanos nos torna cúmplices
do nazismo? Ou, como defendem alguns “praticantes da biomedicina”
(p. 236), os dados devem ser utilizados pela ciência e,
principalmente, pela medicina, para não serem desperdiçados?
Podemos perguntar, nesse momento, quais são as pautas éticas que
estão em jogo. Na defesa do aproveitamento, faz-se uma diferença
utilitária entre a experiência (denunciada com vigor) e os
resultados científicos (aproveitados, pois geram benefícios aos
seres humanos). Se uma determinada experimentação com humanos, cujo
protocolo de procedimentos parece mais com sevícias e torturas,
resulta na descoberta da cura do câncer, devemos desperdiçar tal
resultado por motivos éticos que não separam a experiência do
resultado?
Por outro lado, aquém e além das querelas éticas, o mercado abre a
possibilidade de aproveitar os resultados científicos de
experiências inumanas. Por que não, principalmente no âmbito de
uma medicina ultraprivatizada, logo, inserida nas lógicas econômicas
do mercado capitalista? Numa nota de rodapé, Martins alerta sobre
tal possibilidade e, weberianamente, pergunta-se sobre a pertinência
de se pensar a “situação clínica” ou a “situação
biomédica” como “situações de classe” – tais situações
não implicam “oportunidades de mercado” e acessos a bens no
mercado? E vai ainda mais longe no alcance de sua análise: o mercado
capitalista da saúde, além de sobredeterminar a inovação
tecnológica (vide a indústria farmacêutica), pode fazer o mesmo em
relação à estratificação social. A produção biológica de
seres pós-humanos (a “ciborgueficação” do humano, por exemplo)
traria uma reconfiguração na hierarquia social, agora comandada por
uma biologização da estratificação social – a desigualdade,
antes social, seria enfim absolutamente naturalizada, ou melhor,
seria artificialmente naturalizada.
Martins, nesse momento, aproxima-se da noção de vida nua de
Agamben. Nesse mundo de horrores tecnocientíficos, a vulnerabilidade
social ficaria passível de experimentação biomédica. Em nome da
“experimentabilidade” (p. 222), os excluídos seriam
sacrificáveis em prol da ciência e, claro, do bem-estar dos
pós-humanos. Martins tenta mostrar que, entre a “tanatocracia” e
a “biocracia”, as passagens são múltiplas e cotidianas. Há uma
fabricação de microdistopias já no cotidiano da tecnociência
biomédica – afinal, existem agora microeugenias de mercado (p.
286). Tais passagens indicam um sentido vocacional entre os
tecnocientistas? Martins apenas insinua, mas alerta, por igual, que a
dignidade é forte e volátil, ao mesmo tempo, no sistema
ultra-abstrato e virtual do capitalismo contemporâneo. Radicalizando
essa posição, pode-se indagar se o cientificismo torna rarefeita a
dignidade ou se o cientificismo facilita a passagem, nas palavras de
Martins, do “fanatismo da pesquisa” ao “fanatismo da
transgressão”. Nesse sentido, não haveria limite ético ou mesmo
humano, dada a sua infinita potência, à tecnociência.
Seria
palpável a concatenação lógica da discussão de Martins. Da
análise do risco, ele passa à experimentação em humanos e, como
possível desdobramento geral, desemboca justamente no capítulo VII,
“Para uma sociologia das calamidades” (p. 255). Não se negue a
lógica desse caminho, pois a calamidade está presente na potência
mesma da tecnociência – os impactos tecnológicos, no nosso mundo,
rodopiam o pião da dialética entre o céu e o inferno. E, como tais
calamidades não são “naturais” e sim “antropogênicas”, são
assim, para utilizar uma linguagem construtivista, “construções
sociais”, logo, faz-se presente a necessidade de uma abordagem
sociológica. Nesse momento, voltamos ao debate sobre a visão
fáustica da tecnologia. Seriam tecnologias puras, sofisticadas e
belas, “não subordinadas a baixas finalidades utilitárias do
bem-estar banal das grandes massas, mas a grandes missões coletivas”
(p. 259). Seria a visão nazista, pois a tecnologia como vontade de
poder, sem fins humanitários. Fausto, no caso, seria o Prometeu
Transgressor (o tecnocientista defensor do “fanatismo da
transgressão”) e não o Prometeu benfeitor da humanidade.
Faz parte da tradição alemã (Spengler, Jünger e Heidegger) o medo
do Fausto, talvez porque só exista, na verdade, um Prometeu,
justamente o Transgressor. Seria o domínio tecnológico da Natureza,
prescindindo de qualquer fundamentação ética – a tecnologia, na
sua potência, seria um movimento infinito. A subordinação da
tecnologia ao bem comum e à emancipação da espécie (visão do
Prometeu Benfeitor) seria atrelá-la à finitude humana – daí a
necessidade da visão fáustica de ultrapassar o demasiado humano.
Martins não é alemão, mas também tem medo de Fausto. Como já
vimos, relaciona o complexo tecnocientífico aos ditames do mercado
capitalista. Está embutida, nessa relação, a afinidade eletiva
entre a visão fáustica e a acumulação ampliada do capital.
Afinal, os dois mecanismos têm como mira o infinito, isto é, a
abstração ou “neutralização” (p. 274) de qualquer limite
humano. A experimentação transmutou-se em empreendimento, cuja
conotação tecnocientífica ou mercantil misturam-se, a ponto de
serem indiscerníveis. A biotecnologia torna-se, assim, a engenharia
biológica dos seres humanos – a natureza humana torna-se, enfim,
completamente artificial.
A visão fáustica impõe um ritmo normativo impossível. A ética
não consegue se antecipar ou regular a tecnologia (p. 260); na
verdade, a ética está sempre correndo atrás, adaptando-se às
novas conjunturas tecnológicas. A ética de Fausto é a adaptação
ou, num sentido mais prosaico, posterior à catástrofe. Como afirma
Martins: “se prosseguirmos na trajetória atual e o pior acontecer
(e nunca termos a certeza ou uma alta probabilidade confiável de que
não vai acontecer) será demasiado tarde” (p. 261). Seria o
“dilema do zero e do infinito” – não seria arriscado dizer que
não há resolução ética a esse dilema, exceto a sua superação.
Por isso, a tecnociência fáustica, ao colocar a ética ao seu
reboque, pode também impor “neutralizações”, “adiaforizações”
(ou mesmo, no sentido agambeniano, “profanizações”) a tudo que
era ou é sagrado e intocável – assiste-se a tal fenômeno na
bioética, sempre a reboque das biotecnologias reprodutivas, por
exemplo.
Como evitar essas novas calamidades e, ao mesmo tempo, combater a
tecnociência fáustica? Martins discute a relação entre o “dever
fazer” e o “poder fazer”. Critica o dever de se fazer tudo que
seja tecnologicamente possível (p. 270). É o Princípio de
Plenitude Tecnológica (PTT): tudo que é tecnologicamente possível
será um dia realizado – não se deve combater a inovação
tecnológica; não se deve lutar contra o progresso. Insinua uma
ética do “não fazer” de Hans Jonas ou da “vontade” de
Renouvier (p. 272). Mas, aparentemente, tais éticas não o
satisfazem – afinal, provavelmente o problema não se esgote na
ética.
Seria nesse instante que talvez percebamos o momento de desespero
(logo, num sentido trágico, de esperança) de Martins. Inicialmente,
é propedêutico: “o Prometeanismo iluminista precisa ser corrigido
e reformado porque se confunde cada vez mais, na prática,
paradoxalmente, com o faustianismo anti-iluminista” (p. 296).
Depois, vai muito além das fronteiras desse mundo, ao defender uma
nova Era Axial (período histórico no qual surgiram as grandes
religiões). Ora, Martins faz uma relação entre as inovações
tecnológicas (a agricultura, por exemplo) e a Era Axial. Há, aqui,
a sugestão de que inovações tecnológicas de longo alcance colocam
ou reconfiguram profundamente os valores de toda uma época. Como
estamos no meio de incríveis transformações tecnológicas, cujo
foco, inclusive, é a própria natureza humana, talvez ocorra (ou
exista a possibilidade de) uma Nova Era Axial que consiga uma
rearticulação ética global, reconfigurando “prometeicamente”
as relações entre o humano e a tecnologia. É preciso interpretar
essa esperança como uma aposta. É um desafio de grande alcance –
não devemos negar sua sedução como utopia. Talvez, por isso,
Martins quase peça a Deus pela resolução do Grande Impasse da
Tecnologia (GIT): “Oxalá, os tempos sejam propícios a uma
cristalização ética e axiológica comparável à da Época Axial,
em que certamente a ética, a estética e a filosofia ambientais, a
sensibilidade ambientalista, como a reconsideração urgente e
fundamental da antropologia filosófica e da zoologia filosófica dos
limites do humanum e das nossas relações com os (outros)
animais terão um papel importante na clarificação da ordo
amoris” (p. 291).
III
Sob o título “Passagem para o Pós-Humano”, a terceira parte do
Experimentum Humanum abriga um conjunto de ensaios dedicados a
pensar alguns temas-chave das transformações que a ciência e a
tecnologia vêm impondo à humanidade – até o ponto de que alguns
teóricos venham a pensar acerca de uma superação técnica do
humanismo. Um dos temas que compõem as reflexões sobre a
eventualidade de nosso presente pós-humano é certamente o da
aceleração. A esse respeito, há muito o que aprender com Martins.
Procedendo a uma importante genealogia daquilo que Paul Virilio
chamaria de dromocracia, três “variedades de aceleracionismo”
são identificados entre os teóricos que já se dedicaram a este
tema. A primeira delas diz respeito à identificação que existe
entre as novas tecnologias de informação e comunicação e a
aceleração. E aqui não se está falando apenas de Paul Virilio, do
“tom apocalíptico” que ele impõe mediante diagnósticos de
crise da subjetividade, impossibilidade de reflexão na
“dromoscopia”. O economista sueco Staffan B. Linder, ao teorizar
sobre a “fome do tempo”, já a partir da década, via na
preferência por produtos descartáveis um aspecto importante do
aceleracionismo. Nas “três últimas décadas”, considera
Martins, “vivemos numa economia-mundo de maximização de fluxos –
energéticos, informacionais, materiais, virtuais, financeiros […]
e, conversamente, de minimização dos stocks” (p. 307).
Em oposição à aceleração da vida, do consumo, das “guerras do
tempo”, de que fala Jeremy Rifkin, Martins considera também o
surgimento de movimentos de resistência, tais como o “slow food
movement”, ou o “slow cities”. A “aceleração da
aceleração”, ou seja as transformações sociais e culturais que
sobrevêm à “mudança técnica”, tal como propõe o sociólogo
Hornell Hart, ou a ideia de “ortogênese tecnológica”, “como
um momento dos processos de aceleração cósmicos e biológicos”,
de que nos fala o filósofo François Meyer, constituem, entre
outros, momentos importantes desse primeiro tipo de percepção da
aceleração. Um segundo modo de perceber essas transformações é
dado por aqueles que defendem que “o crescimento exponencial do
conhecimento tecno-científico e do progresso tecno-econômico é
indispensável para suportar as dificuldades que decorrem da crise
ambiental generalizada e das alterações climáticas sem paralelo
nos últimos 10.000-12.000 anos” (p. 310). A tese aqui é
claramente acelerar a aceleração para solucionar os problemas
acarretados pela aceleração tecnológica – Martins, recorrendo a
uma metáfora já usada ao longo de seu livro, qualifica esse tipo de
postulação de “panglossianismo dinâmico”, o que nos parece
justo. A terceira variedade do aceleracionismo corresponde à
percepção de que os avanços nas tecnologias da computação, na
robótica, na nanotecnologia, abrem a possibilidade de um futuro
pós-humano, um futuro em que as limitações de nossa condição
biológica seriam superadas. Variação do panglossianismo dinâmico,
posto que a aceleração tecnológica parece não nos dar alternativa
que não seja reconhecer e aprofundar nosso destino ciborgue, os
transhumanistas parecem não estar muito distantes de uma antiga
tradição do pensamento ocidental, e de seu sentido religioso, para
quem, afinal, nossos limites biológicos sempre foram um entrave para
a realização plena do espírito.
Um dos méritos do oitavo capítulo do Experimentum Humanum,
“Aceleração, progresso e Experimentum Humanum”, é propor a
questão populacional, tal como ela surge sobretudo a partir de
Malthus, ou seja, no século XVIII, como âmbito crucial das
discussões sobre aceleração. Martins não faz muito estardalhaço
acerca de seu gesto teórico, mas o que temos aqui, como a própria
estruturação do capítulo ajuda o leitor a depreender é uma
confluência entre considerações sobre aceleração e 'biopolítica'
(o autor não usa o jargão foucaultiano). E isso é em si
teoricamente auspicioso. Que os elementos teológicos, em cujo bojo
surgem essas discussões, sejam também apresentados, é um bônus
considerável. “Em uma primeira fase, esta problemática foi
tratada por teólogos cristãos nos séculos XVII e XVIII, tanto
luteranos alemães como anglicanos, e a demografia surgia como uma
demoteologia em que o papel da Providência como deus
arithmeticus, que dispõe, na frase bíblica, de “peso, número
e medida” […] foi crucial” (p. 315). Se é possível dizer que
as postulações malthusianas sobre uma contradição entre a
tendência de crescimento geométrico das populações humanas e o
crescimento aritmético dos recursos necessários à sua subsistência
como problema central, em torno do qual serão formulados os ideais
de progresso e perfectibilidade iluministas, não há também como
negligenciar o quanto elas foram importantes para que Wallace e
Darwin chegassem, por vias separadas, à ideia de uma concorrência
geral entre os seres vivos (p. 316). Economia, biologia e teologia,
portanto, amalgamam-se em uma mesma discussão. Em 1864, destes
elementos, Wallace concluía que a extinção de raças humanas
“inferiores” seria algo desejável – tese aceita em termos
gerais por Darwin, como o demonstra sua correspondência com Wallace
(p. 317). Esse conjunto de ideias, por seu turno, a defesa da
“sobrevivência dos mais aptos”, tem uma influência decisiva no
utilitarismo de Herbert Spencer, formulação que vem, por seu turno,
reforçar o darwinismo, ao conferir-lhe um sentido ético, e
transcendente. Assim é que, para o utilitarista William Paley: “a
maximização da soma algébrica de prazeres e dores no mundo vital
tornava patente a arte sábia do legislador divino” (p. 319).
A argumentação deste capítulo é concluída com uma reflexão
acerca da singularidade humana diante da aceleração tecnológica,
reflexão que passa em revista especulações transhumanistas, acerca
de uma transformação ontológica radical da condição humana; ou a
expansão tecnológica em nível molecular – e a constituição
desse terreno novo de investigação que Drexler chamou de
nanotecnologia e que resulta da confluência entre a genética, a
física, as ciências da informação e as neurociências – e a
disseminação dos inúmeros fantasmas ali albergados, que vão da
nanopoluição à destruição da vida na Terra; ou ainda os
discursos acerca da nossa nova condição ciborgue. Martins retoma,
assim, argumentos já expostos em outros momentos de sua coletânea
de ensaios. O interessante é perceber que, ao longo de todo o texto,
em seu diagnóstico das novas tecnologias e da aceleração, Hermínio
Martins sublinha constantemente a importância da análise de
elementos econômicos, científicos, ou mesmo dos que provêm da
ficção científica, mas também de influências culturais
escatológicas, ou seja, a presença de um discurso religioso
conferindo um sentido particular a todas essas especulações sobre o
inevitável de nosso destino pós-humano. Assim: o que fazer da
perspectiva de uma “segunda antropogênese”, da constituição
deste “Novo Adão”? “Poderá deixar de ser um mero homo
faber […] e tornar-se finalmente o faber homininis, […], e
não por qualquer processo de desenvolvimento espiritual, embora um
Homem de certo modo tacitamente autodeífico” (p. 344).
No capítulo XIX, sob o título “Biologia e política: eugenismos
de ontem e de hoje”, Martins se debruça sobre a condição humana
convertida em um problema técnico e científico, mas sobretudo
político. De certo modo, o que assusta o leitor não é a existência
de um discurso historicamente datado sobre os cuidados positivos ou
negativos a serem tomados pelo Estado para corrigir o que seria uma
tendência biológica dos menos inteligentes serem mais férteis que
os mais inteligentes, aqui considerados como geneticamente
superiores, mas a permanência desse discurso entre cientistas na
contemporaneidade. Assim, em 1996, Richard Lynn argumenta que a
“deterioração genética” nos países industrializados é algo
bem real, que é apenas contrabalançado no curto prazo por fatores
ambientais (como uma melhor alimentação das raças ditas
“inferiores” – p. 259-260). Para Martins, a manipulação
genética surge para alguns cientistas como possibilidade de um “novo
eugenismo” em que os “mais inteligentes” poderiam ser clonados
em massa, e um melhoramento da espécie humana passaria a ser
possível. “O eugenismo sempre partilhou alguma coisa da dicotomia
fundamental do apocalipticismo religioso, ou das ideologias seculares
catastrofistas: ou o abismo, ou a ascensão, tertium non datur”
(p. 366).
Largamente concebido como uma prerrogativa do Estado, o eugenismo
clássico é hoje superado por algumas tecnologias reprodutivas que
colocam nas mãos dos cidadãos a possibilidade de decidir, mediante
genetic screening, ou diagnóstico genético pré-implantação,
entre muitas outras tecnologias, acerca de que tipos de fetos são
desejados, e quais deveriam ser descartados. “As tecnologias em
questão também tornam possível o feticídio em massa de fetos do
sexo feminino” (p. 367) em países como a Índia e China. E, neste
caso, estamos falando de biotecnologias simples e baratas, o
ultrassom e a amniocentese.
O décimo capítulo, que conclui o Experimentum Humanum,
intitulado “Verdade, Realismo e Virtude”, discorre sobre o
estatuto das ciências modernas diante do ceticismo que, antes de ser
uma falha em sua trajetória, parece estar intimamente relacionado às
suas trajetórias. Neste contexto, todo ceticismo epistemológico, na
medida em que reduz o problema da verdade a uma adequação entre
intelecto e coisa, ou entre sujeito e objeto, traz sempre à tona a
questão da finitude e impotência humana diante de um mundo que já
encontramos constituído. E se o movimento da ciência moderna é em
grande medida de superação ou suspensão dessa dificuldade
epistemológica, a própria ideia de um conhecimento infinitamente
aperfeiçoável dá uma noção do quão pessimista é a consciência
científica acerca da perspectiva de uma superação definitiva do
ceticismo. A “novidade epistêmica do mundo moderno, as ciências
matemático experimentais” (p. 408), não são páreo para esse
elemento mais fundamental da própria cultura ocidental, posto que,
mesmo que cheguemos a postulados matematicamente universais e
seguros, a dificuldade é sempre, como diria Kant recorrentemente em
suas três Críticas, como aplicar a lei geral ao caso
particular, ao objeto que temos diante de nós. Assim, “Para
Popper, nenhum enunciado pode ser 'justificado' e a verdade,
compreendida no sentido da Teoria da Verdade como Correspondência,
numa versão semântica, supostamente tarskiana, da vetusta tese da
verdade como adequatio rei et intellectus, neste falibilismo,
como um ideal regulativo imprescindível para a ciência, e todo
conhecimento objetivo, e nunca como um fato consumado” (p. 409).
Assim, o “relativismo adverbial” de Nelson Goodman, sua crença
no caráter irredutivelmente plural das visões de mundo que compõem
o que chamamos de realidade, e aqui também nos recordaríamos de
Weber, é um elemento estruturante da própria dinâmica científica.
Martins acredita, na verdade, que o relativismo epistemológico não
é apenas um traço da ciência moderna, mas também de sua ética e
estética. Em todos esses âmbitos, o ceticismo é condição de
surgimento de uma sociedade de indivíduos, acrescentaríamos. E se
ele também foi entendido como companheiro inevitável de soluções
autoritárias de poder, pois que, neste caso, verdade e poder parecem
se referenciar mutuamente, parece não haver dúvida de que o
“relativismo ético”, por exemplo, pode ser postulado, na obra de
Hans Kelsen, por exemplo, como um convite à democracia.
É como reflexão que solicita constantemente uma politização, ou
seja, que pode ser facilmente convertida numa discussão sobre poder
que as ciências modernas, no âmbito de seu ceticismo estrutural,
apelam à técnica. Num certo sentido, o que temos aqui é uma
rearrumação de um postulado da filosofia medieval segundo o qual
conhecer, ter acesso à verdade das coisas, é poder produzi-las - postulado reelaborado por Vico, no século XVII.
Deus, como artífice do universo, tudo conhece. Para a tecnociência,
assim, conhecer o real está diretamente associado à capacidade de
criar realidade. Evidentemente, essa resposta traz em seu bojo
questões éticas dificilmente contornáveis quando nos apercebemos
do ceticismo também neste âmbito.
Vivemos numa época em que a questão da autonomia da ciência não
se coloca já no plano da sua relação com o poder político, com as
ideologias oficiais, como na ideocracia soviética, ou com os grandes
sistemas de crenças tradicionais, pelo menos no Ocidente. Na
conjuntura atual, os processos potencialmente subversivos da
autodeterminação ou auto-regulação científica, que no passado
pelo menos eram da primeira importância para os cientistas,
decorrem, em primeira instância, da desdiferenciação e
interpenetração da ciência e da tecnologia, da tecnociência e da
economia, da “capitalização do conhecimento”, do novo modo de
produção do conhecimento científico, coletivizado, finalizado,
industrializado e comercializado do princípio ao fim (p.429).
2 comentários:
Caros autores,
Eu, Chapeuzinho Vermelho, vos pergunto: e por que essa resenha tão grande? Seria para comer as esperanças de resistência dos “slows sciences” da vida? Finalmente entendo a citação que o Cazzo faz de Dante...
Brincadeirinha de lado, vocês conseguiram convencer sobre a importância da obra de Hermínio Martins. Coei a seguinte articulação: tecnociência-economia-“capitalização do conhecimento”-grande indifférence X resistência, os três primeiros elementos sendo sistêmicos, enquanto os dois últimos, em tensão, referindo-se às subjetividades envolvidas, em aberto, naqueles elementos sistêmicos. Como parece que Martins argumenta pouco sobre as resistências à aceleração enquanto componente da interpenetração teconociência-economia de mercado, a leitura da resenha remeteu-me imediatamente à célebre frase da campanha de Bill Clinton: “é a economia, estúpido!” Em outros termos, parece obra que nos convida a abandonar de vez a subestimação da dimensão econômica de toda essa problemática. Isso não significa abordar de maneira objetivista/materialista a questão da autonomia científica na contemporaneidade, mas pensar que a necessária análise da dimensão econômica da dinâmica societal não implica necessariamente em abordagens economicistas.
Oi, Tâmara.
É para você ler bem lentamente, Chapeuzinho.
Hermínio menciona esses movimentos de resistência à aceleração, mas está mais interessado em pensar, segundo me parece, esses vetores mais dromológicos do capitalismo contemporâneo.
Aqui só conseguimos mencionar umas poucas linhas do trabalho de Hermínio Martins(mesmo assim, veja o tamanho). Vale a pena conferir mais de perto.
Abraço, Jonatas
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