sábado, 23 de outubro de 2010

Entre a Inclusão e a Democracia Digital: a atuação do Estado e do terceiro setor em comunidades pobres da Região Metropolitana do Recife



Jonatas Ferreira e Maria Eduarda da Mota Rocha

Introdução


Na análise da desigualdade, as ciências sociais têm operado ao longo dos anos vários recortes, tais como renda, etnia, acesso ao trabalho, participação política. A partir da segunda metade do século XX, com o surgimento das novas tecnologias de informação e comunicação, especificamente computadores pessoais, Internet, mecanismos portáteis de armazenamento de dados, como pendrives, ipods, CDs regraváveis, entre tantas outras possibilidades postas pela tecnologia digital, uma nova forma de desigualdade surgiu. A acumulação histórica de capitais econômicos, culturais e sociais dos diversos atores sociais, como era de se esperar, vem determinando padrões qualitativamente diferenciados de acesso a estes recursos. Não parece casual, portanto, que em 2007 apenas 24% dos domicílios brasileiros tivessem computador – desse total, apenas 3% representavam domicílios com renda até R$ 380, valor que alcança os 72% quando consideramos domicílios com renda igual ou superior R$ 3.801. O acesso à Internet traz à tona uma realidade ainda mais constrangedora: apenas 1% das famílias que sobrevivem com até um salário mínimo tinham acesso à grande rede. Em geral, esse problema tem sido tratado pelas políticas públicas a partir de uma série de conceitos que convergem para as idéias polares de ‘exclusão’ e ‘inclusão digital’. O ponto de partida desse tipo de abordagem é a idéia de digital divide, tal como formulada pela National Telecomunications and Information Administration, ainda na década de 90. A partir dessa perspectiva, a solução para o problema da desigualdade se apresenta como um percurso que os atores precisam fazer de um lugar vazio, de uma tabula rasa, para outro de prosperidade, numa clara reatualização da visão dos atores em posição subalterna como seres faltantes.


Ora, esse tipo de visão tem uma penetração significativa nas ciências sociais, bastando considerar a maneira como a tradição marxista, mas não apenas ela, percebeu ao longo dos anos o papel de forças sociais não diretamente ligadas ao processo produtivo. Visão semelhante dos mais pobres como “despossuídos” aparece na idéia bourdiana de “arbitrário cultural”, em que as práticas de consumo dos dominados são avaliadas sempre em função de uma hierarquia unificada cujo cume e eixo moral são necessariamente os gostos das classes dominantes. Em função deles as práticas culturais subalternas aparecem como imitações mal-sucedidas. É certo que tal perspectiva pode ser contrastada com propostas mais matizadas, como a de Alba Zaluar, ou a de Vera Telles e sua conceituação da pobreza como “experiência da liminaridade”, em que o esforço para superar uma definição puramente negativa da pobreza como falta não flerta com uma visão populista muitas vezes subjacente à celebração das competências das classes dominadas. Críticos das implicações políticas trazidas pela idéia de exclusão digital, tais como Mark Warshauer, Henry Jenkins ou Jeffrey Young1 acreditam que a “retórica da exclusão digital mantém aberta a divisão entre usuários de ferramenta civilizados e não usuários incivilizados. Bem intencionada como iniciativa política, ela pode propiciar a marginalização e ser fonte de privilégios em seus próprios termos”. Ainda assim, no tratamento conceitual e político da desigualdade digital, a idéia de “exclusão” continua presente.

[Esse texto foi publicado na íntegra na revista eletrônica Liinc em Revista. Click aqui para baixar todo o texto em PDF]

12 comentários:

Tâmara disse...

Oxente, São Jonatas?!!!
Essa entidade santa dai' parece-me tão afro quanto aquela que eu sugeri - a Pomba Gira da Paz. A rejeição de minha proposta, santo companheiro, deveu-se realmente às sensibilidades evangélicas atuais ou apenas ao gênero da Gira?
Acuda, cumade Cynthia! Aplique sobre esse rapaz uma epistemologiazinha feminista!

Le Cazzo disse...

É que uma vez que você começa uma enquete, e alguém vota, não é mais possível tecnicamente incluir outras opções. Mas vou procurar uma Pomba Gira e colocar no lugar do Preto Velho - que é uma foto minha do tempo que eu fumava cachimbo. Jonatas

Cynthia disse...

E essa enquete termina quando, mesmo?

Le Cazzo disse...

Não entendi... Tem indicado abaixo da opção votar. No momento, faltam 4 dias para o final da enquete. Jonatas

Tâmara disse...

E', acho que tem sentido não mudar as opções no meio de uma enquete. Como é que eu não pensei nisso antes?! Obrigada pelo esclarecimento metodolo'gico.

E você era bem bonitinho no tempo em que fumava cachimbo. E era também, pelo menos aparentemente, mais paci'fico do que essa Pomba Gira. Mas não tinha porque trocar um pela outra, somados eles ficam bem: o Velho traz a paz e a Gira a alegria que o Cazzo precisa em seu caminho para a conversão. So' achei que ela esta' muito cor-de-rosa; onde ela mora não tem praia não?

Cynthia, amiga, paciência: em quatro dias isso lhe passa.

Cynthia disse...

Só para eu ter certeza de quanto tempo vou ter que olhar só para o lado esquerdo do blog. Morro de medo dessas coisas. E não é só essa Pomba Gira que vocês escolheram: minha mãe ficou revoltadíssima quando me recusei a colocar no meu quarto a imagem de uma santa não sei das quantas que ela me deu de presente. Imagina se eu vou dormir com uma figura dessas olhando pra mim a noite inteira! E essa que vc escolheu é mais punk do que a outra. Pelo menos ela não ficava olhando pra mim com esse riso sádico. Pior do que isso só aqueles santos que têm cabelo de gente e olhos de vidro. Vade retro!

Tâmara disse...

No fundo (e no raso também) eu concordo com você, Cynthia, essa Pomba Gira tem riso sa'dico. Quando olhei para ela tomei um susto! Mas, em meu esforço herculi'neo para a conversão e a paz, resolvi dizer que ela representava a alegria. Na verdade acho que tudo não passou de um mal-entendido: eu não reconheci Jonatas naquele Preto Velho até bonito (o colega remoçou demais parando de fumar; deu até vontade de fazer o mesmo), reclamei por sexismo, mas desconfio que ele não perdoou o meu não reconhecimento: tascou-me essa Pomba Gira pouco paci'fica e absurdamente rosada (sera' que esta' com sarampo ou catapora?)
Fazer o que? Aguardemos os resultados da enquete. E esperemos que ele não revele que a imagem é dele mesmo também, na época em que era Drag Queen na Inglaterra, ja' que com um passado desses fica difi'cil sua conversão à pureza cristã.

Le Cazzo disse...

Drag queen na Inglaterra?!!! Talvez seja melhor nos atermos à discussão do texto que fiz com Maria Eduarda.

Cynthia disse...

Hahahahaha! Quem manda ficar dando ideia?

E Tâmara tem toda razão: essa sua Pomba Gira tem uma cor estranha. E ainda por cima é siliconada.

Tâmara disse...

Cari'ssimo,
De fato, eu não me ative ao texto, fui muito mais longe com ele : considerando as TICs como horizonte tecnolo'gico e pensando a desigualdade digital sob o prisma da democratização, exercitei a criatividade, discuti conteu'dos, reconstrui representações, enfim, fui reflexiva diante dos conteu'dos propostos lado a lado pelo blog, ao invés de me limitar a uma adaptação passiva e bina'ria para fins de empregabilidade no mercado das ciências sociais. E ainda inclui nessecidades e representações da comunidade, na pessoa de Cytnhia Hamlim (também morro de medo de santo com cabelo de gente e olho de vidro). Sacou?

Tâmara disse...

Eita! Vocês viram como escrevi necessidades?!!! Desculpe ai' e boa semana para todos.

Le Cazzo disse...

É simplesmente a velha questão da hospitalidade que, parece-me, também se aplica ao mundo virtual: "em terra que pouco conheces, pisa no chão devagar". Bom, o adágio é mais ou menos assim. Jonatas